Sobrecarregado há um ano e meio pela pandemia de covid-19, o sistema de saúde das regiões Norte e Centro-Oeste precisa se preparar para os efeitos do início da temporada de queimadas. As partículas em suspensão dos incêndios podem ser mais nocivas do que a poluição do ar urbano. O alerta é de um estudo da Global Climate and Health Alliance feito no Brasil, Canadá e na Austrália.
Os incêndios provocados pela ação humana devem afetar a qualidade do ar nas cidades, a até milhares de quilômetros de distância, pois o material particulado, metais vestigiais e gases de efeito estufa podem se dispersar para longe das florestas.
O relatório adverte que, em todo o mundo, os governos devem preparar os sistemas de saúde para os impactos de incêndios recorrentes causados pela aceleração da crise climática, pelo desmatamento e pelo manejo precário da terra.
Na Amazônia, as partículas emitidas pela queima de biomassa permanecem na atmosfera por, pelo menos, uma semana e podem ser transportadas por longas distâncias, afirma o documento. Segundo uma estudo publicado em 2017 na revista Nature, a queima de biomassa na região amazônica causa danos ao DNA e morte celular em células pulmonares humanas.
Dois dos mais importantes biomas brasileiros, a Amazônia e o Pantanal, vêm sofrendo com queimadas recorde desde o início da gestão do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o desmonte sistemático dos órgãos de fiscalização.
Em 2020, a Amazônia teve 103.161 focos de incêndio, de acordo com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Isso representa aumento de 15,5% em relação a 2019, quando haviam sido registradas 89.176 ocorrências.
A maioria dos focos de incêndios florestais na região é registrada no Arco do Desmatamento que se estende do Pará ao Mato Grosso, e até a área de fronteira entre o Brasil e o Peru e a Bolívia.
Também no ano passado, o Pantanal registrou seu recorde de queimadas, 22.116 casos. Foi o maior número desde que os focos de incêndio passaram a ser medidos nesse bioma pelo Inpe, em 1998. Em relação a 2019, os focos de queimada mais do que dobraram, conforme a reportagem do Estadão.
Embora os efeitos a curto prazo da fumaça dos incêndios florestais sobre a saúde estejam bem documentados, os efeitos a longo prazo da exposição prolongada ainda são desconhecidos, afirma o estudo.
Doenças e mortes
A fumaça dos incêndios florestais causa cerca de 339.000 mortes prematuras por ano em todo o mundo, muito mais do que aquelas por causa direta, estima um estudo de 2012 realizado por pesquisadores canadenses, norte-americanos e australianos.
A exposição a qualquer aumento da poluição do ar pode causar efeitos adversos na saúde humana, especialmente em crianças, idosos e pessoas com condições médicas crônicas preexistentes.
Os impactos no curto prazo da fumaça dos incêndios florestais incluem tosse e falta de ar. Ela também é um gatilho para episódios de asma e está associada a um aumento no atendimento hospitalar de emergência após um curto período de exposição, particularmente em crianças. Estudos recentes encontraram uma relação com os pedidos de ambulâncias por problemas respiratórios, cardiovasculares e por diabetes.
As fontes de água também podem ser contaminadas pelas cinzas dos incêndios. Os povos indígenas da Amazônia brasileira são particularmente vulneráveis à fumaça porque nessas comunidades há uma alta prevalência de doenças respiratórias evitáveis, como a tuberculose, em comparação com a média nacional.
No relatório da Human Rights Watch sobre a poluição do ar durante as queimadas de 2019 na Amazônia, constatou-se que muitas pessoas tinham acesso limitado às unidades de saúde, portanto os dados sobre o número de pacientes hospitalizados no Brasil só oferecem uma imagem incompleta do impacto dos incêndios sobre a saúde.
Estima-se que quase três milhões de pessoas foram expostas a níveis nocivos de material particulado fino durante os incêndios daquele ano.