O recurso é assinado pela a subprocuradora-geral da República Lindôra Araújo e pede que, caso Fachin não reconsidere sua decisão monocrática, o caso seja julgado pelo Plenário do Supremo e que a competência da 13ª Vara Federal de Curitiba seja mantida. Na decisão em que anulou todas as decisões tomadas por aquele juízo nos processos de Lula, Fachin determinou a remessa dos autos à Justiça Federal de Brasília.
Caso essa primeira solicitação não seja aceita, a PGR também pede que, considerando ‘o avançado estágio processual e em atenção à segurança jurídica’, a decisão de Fachin passe a ter efeitos daqui para a frente e o Supremo ‘possa decidir pela preservação de todos os atos processuais instrutórios e decisórios anteriormente praticados pelo Juízo da 13ª Vara de Curitiba’. Se tal pedido for acatado, só seriam remetidas a outra vara as duas ações ainda não sentenciadas – as relacionadas ao Instituto Lula -, diz o órgão.
Na hipótese de não acolhimento de nenhum dos pedidos anteriores, Lindôra requisita que os processos contra Lula sejam enviados à Justiça Federal de São Paulo, ‘na medida em que os casos em questão abrangem fatos e valores relativos a imóveis e instituto sediados naquele estado’.
“A PGR entende que, por terem por objeto crimes praticados no âmbito do esquema criminoso que vitimou a Petrobras, todos os processos estão inseridos no contexto da chamada Operação Lava Jato, e, por tal razão, com acerto, tramitaram perante o Juízo da 13ª Vara Federal da Seção Judiciária do Paraná. Ressalta ainda que a competência da 13ª Vara de Curitiba perdurou por um longo período de cerca de cinco anos”, registrou a instituição em nota.
Plenário
A cúpula da PGR e integrantes do STF avaliam que é difícil o plenário da Corte derrubar a decisão do ministro Edson Fachin, que na segunda-feira, 8, anulou as condenações do ex-presidente Luiz Inácio da Lula da Silva no âmbito da Lava Jato. A decisão individual do ministro habilitou o petista a disputar eleições, o que redesenhou o cenário político para 2022.
Pelo cálculo de procuradores, a decisão de Fachin deve ganhar o apoio de ministros como Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, dois expoentes da ala contrária à Lava Jato no STF. O julgamento deve “bagunçar” as divisões internas da Corte.
O ministro Marco Aurélio Mello já indicou que não aprova o caminho escolhido por Fachin.
“Essa decisão foi realmente uma bomba atômica, gerando uma insegurança jurídica muito grande”, disse Marco Aurélio ao Estadão. “Agora, vamos aguardar até o desfecho do caso da suspeição, que está lá na Segunda Turma, no qual o herói nacional, que tem serviços prestados à Pátria, está passando por bandido”, completou ele, numa referência ao ex-juiz Sérgio Moro.
Fachin não avisou aos colegas com antecedência sobre o teor da decisão que tornaria Lula elegível, mas, depois de assiná-la, entrou em contato com Fux por telefone. O Estadão apurou que o presidente do STF viu com bons olhos a manobra do colega para reduzir danos, tentar tirar o foco do ex-juiz da Lava Jato Sérgio Moro e, com isso, tentar preservar outras condenações da operação. Fachin optou por se antecipar a uma decisão da Segunda Turma sobre a parcialidade de Moro na condução da Lava Jato. O julgamento pode invalidar as provas contra Lula, provocar um efeito cascata e invalidar outros processos da investigação.
Com a decisão que determinou o envio dos casos à Justiça Federal do Distrito Federal, Fachin queria dar como encerrado o debate sobre a conduta de Moro. Para o relator da Lava Jato, como a condenação de Moro contra Lula na ação do tríplex do Guarujá foi anulada, não haveria mais motivos para se questionar a atuação do ex-juiz.
‘Atropelo’
Apesar do “atropelo” de Fachin, o ministro do STF Gilmar Mendes contrariou o colega e resolveu levar adiante o julgamento sobre a suspeição de Moro, que acabou interrompido. O placar ficou empatado em 2 a 2 após o pedidopara mais tempo de análise do ministro Kassio Nunes Marques.
Dois ministros ouvidos pelo Estadão observaram que Nunes Marques não deve demorar muito para liberar o caso para julgamento na Segunda Turma. Na prática, o pedido de vista do ministro novato dá tempo para as articulações dos colegas.
Até então, Gilmar e Lewandowski eram resistentes à ideia de apoiar Fachin devido à tentativa de esvaziar a análiseda suspeição de Moro. Agora, no entanto, a Segunda Turma já decidiu que o julgamento do ex-juiz da Lava Jato será concluído de qualquer jeito, com risco concreto de Moro ser declarado suspeito, ter a conduta repudiada pelo Supremo e até acabar obrigado a pagar os custos processuais do caso de Lula.
Para embasar a sua decisão de 46 páginas, Fachin pesquisou um total de 20 precedentes da Corte, tanto do plenário quanto da Segunda Turma. Neles, casos sem conexão direta com o esquema de corrupção na Petrobrás acabaram tendo outro destino que não Curitiba. Na maioria deles, o relator da Lava Jato foi voto vencido, como fez questão de destacar na decisão.
No ano passado, por exemplo, contra a vontade de Fachin, a Segunda Turma do STF decidiu enviar à Justiça Federal do DF parte do inquérito que investiga os ex-senadores Romero Jucá e Valdir Raupp pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro na Transpetro. Depois, Edison Lobão e seu filho, Márcio Lobão, solicitaram o mesmo e o pedido de extensão foi atendido por Gilmar.
O entendimento da Segunda Turma também levou Fachin a decidir individualmente enviar à Justiça Federal do DF uma ação penal em que os empresários Germán Efromovich e José Efromovich são investigados, acusados de crimes de corrupção ativa e lavagem de capitais no âmbito da Transpetro.
O relator da Lava Jato decidiu encaminhar os casos de Lula para a Justiça Federal do DF por entender que o petista merecia ter o mesmo tratamento conferido a outros investigados que entraram na mira dos investigadores de Curitiba.
“No contexto da macrocorrupção política, tão importante quanto ser imparcial é ser apartidário”, observou Fachin.