Manaus, sábado 27 de dezembro de 2025
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Fundação Palmares reconhece Baixa da Xanda como o primeiro quilombo de Parintins (AM)

*Da Redação do Dia a Dia Notícia 

Em um marco para o movimento negro e para a cidade de Parintins (distante 369 quilômetros de Manaus), a Fundação Cultural Palmares concedeu à Baixa da Xanda o reconhecimento oficial como comunidade remanescente de quilombo. Este é o primeiro quilombo certificado no município e a formalização ocorreu com a publicação da certidão de autodefinição no Diário Oficial da União nesta sexta-feira (6).

Essa oficialização não apenas valida a identidade afro-indígena da comunidade, mas também celebra sua história de resistência, ancestralidade e rica contribuição cultural, que se enraíza no final do século XIX. O Boi Garantido, nascido nesse território, é hoje o elo mais forte e afetivo que une a comunidade.

Dona Maria do Carmo Monteverde, de 87 anos, matriarca da Baixa e mestre reconhecida dos saberes culturais do Amazonas, compartilha a origem do aquilombamento. Ela revela que o processo começou com sua bisavó, Dona Germana, uma mulher negra escravizada que, após a abolição, encontrou refúgio e estabeleceu moradia na região.

“Toda a história maravilhosa da nossa comunidade, na verdade, começou com minha bisavó, que se chamava Germana. Ela nasceu escravizada, tinha no corpo as marcas da escravidão: as iniciais do dono, ferradas como se fazia com o gado, muitas marcas de chicote, assim contavam os mais velhos. Alexandrina, a Dona Xanda era filha de Germana. A Xanda teve sete filhos e Lindolfo Monteverde, o meu pai, era o mais velho dos irmãos. A Dona Xanda herdou as terras, e eles permitiram que o povo vindos de vários lugares fizessem suas roças e moradas por aqui. E assim começou a comunidade”, detalhou.

A união de povos negros, indígenas e ribeirinhos de diversas partes da Amazônia permitiu a formação de fortes laços comunitários, transformando a Baixa em uma próspera comunidade de pescadores. O local se tornou um porto vital e ponto de encontro para migrantes ribeirinhos, além de moradia para a classe operária de Parintins. A Baixa da Xanda é, ainda, o local de nascimento de um dos maiores ícones da cultura popular brasileira: o Boi Garantido, fundado em 1913 por Lindolfo Monteverde, filho de Dona Xanda, e que se tornou a maior manifestação cultural da área.

Além do Boi Garantido e de outros festejos juninos, a comunidade preserva tradições que mesclam o catolicismo popular, a religiosidade afro-amazônica, a pajelança indígena e saberes de cura, como as rezadeiras. São Benedito e São José Operário foram os primeiros padroeiros da igreja local, dando nome aos bairros adjacentes à Baixa da Xanda.

O reconhecimento oficial pela Fundação Palmares é resultado de um intenso processo de mobilização iniciado em 2024. Este processo incluiu reuniões comunitárias, articulação com outros quilombos da região e a minuciosa produção de documentação histórica pela própria comunidade. Um momento marcante dessa articulação foi a homenagem a Dona Xanda como figura central da Figura Típica Regional “Ribeirinha” no Festival de Parintins 2024, um tributo inédito em mais de 50 anos de festival.

Lara Monteverde, tataraneta de Dona Xanda e bisneta de Dona Maria do Carmo, representa a nova geração da família Monteverde. Atualmente, Lara interpreta a Mãe Catirina do Garantido, figura central do Auto do Boi. Para ela, a certificação da Fundação Palmares é um marco de justiça histórica.

“A certificação da Baixa como território quilombola pela Fundação Palmares vai além de um documento, é o reconhecimento do Estado brasileiro pela história de resistência negra e indígena dos que formaram essa comunidade. Um ato de memória e também de justiça histórica para figuras como Germana e Xanda, mulheres negras que por muito tempo foram esquecidas e invisibilizadas. Essa conquista abre caminhos para fortalecer os saberes dos mais velhos, nossas culturas e tradições”, afirmou.

A certificação da Baixa como quilombo é um momento histórico para Parintins e para o Amazonas. Em 2025, o Boi Garantido, com o tema “Boi do Povo, Boi do Povão”, celebrará a história do Quilombo da Baixa da Xanda com a toada “O Povo Negro da Amazônia”, composta por Jorge Moraes, Helen Veras, Maneca Sobral e Sebastião Bringel.

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