Manaus, sexta-feira 5 de dezembro de 2025
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Com 93% da população indígena, São Gabriel da Cachoeira (AM) é símbolo da diversidade linguística no Brasil

Com uma área extensa — o terceiro maior município do Brasil — São Gabriel da Cachoeira reúne comunidades distribuídas entre rios e serras, conectadas pelo Rio Negro, principal via de transporte e comunicação. Além da relevância cultural, o município tem importância estratégica para o país. Em 1968, foi declarado Área de Segurança Nacional devido à sua localização fronteiriça. Hoje, o território continua desempenhando papel essencial na defesa nacional e na proteção ambiental da Amazônia.

*Audrey Bezerra – Especial para o Dia a Dia Notícia 

Localizado no extremo noroeste do Amazonas, na região conhecida como “Cabeça do Cachorro”, o município de São Gabriel da Cachoeira é o segundo mais indígena do Brasil, segundo dados do Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Situado a 852 quilômetros de Manaus, na fronteira com a Colômbia e a Venezuela, o município abriga uma das maiores diversidades étnicas e linguísticas do país. De acordo com o IBGE, São Gabriel da Cachoeira é o município brasileiro com o maior número de pessoas de dois anos ou mais que falam duas línguas indígenas em seus domicílios e o nono com maior quantidade de línguas indígenas faladas.

A cidade possui 51.795 mil habitantes, sendo 48.256 indígenas, ou seja, cerca de 93% da população é formada por indígenas ou descendentes diretos de povos originários. São 54 etnias que vivem na Calha do Alto Rio Negro, entre elas os povos Tukano, Baniwa, Yanomami e Baré.

A diversidade cultural se reflete também nas línguas. Conforme o Censo de 2022 são mais de 36 línguas faladas no município. Além do português, São Gabriel da Cachoeira possui três idiomas indígenas co-oficiais: nheengatu, tucano e baniwa. O reconhecimento é inédito no Brasil e representa o esforço local para valorizar e preservar as línguas e culturas tradicionais.

Nas ruas, escolas e comunidades ribeirinhas, é comum ouvir diferentes idiomas. Em muitas escolas, o ensino é bilíngue e as línguas indígenas são aplicadas de forma transversal. A língua baré é a mais utilizada nos espaços educacionais. O professor e líder indígena Irineu Baniwa afirma que o reconhecimento linguístico fortalece a identidade dos povos da região.

“Esse reconhecimento das nossas línguas nos fortalece, porque mostra que somos maioria e que continuamos falando as nossas línguas”, disse.

Segundo ele, ainda há desafios na implementação do ensino das línguas indígenas. “Temos muitas dificuldades. Falta material, formação específica e, às vezes, enfrentamos conflitos internos sobre qual língua ensinar”, explicou.

Irineu ressalta a importância de manter o idioma de origem como forma de preservação cultural. “Falando sua própria língua, você garante a sua origem e sabe a qual etnia pertence. É importante que cada aluno fale a língua do seu povo, porque isso mantém viva a cultura e as tradições indígenas.”

Ele relata que, em algumas comunidades, há divergências sobre o ensino das línguas. “Alguns alunos deixam de ir à escola porque não é a língua deles que está sendo ensinada. Essa é uma das nossas dificuldades. Por isso, buscamos ensinar não apenas a língua falada, mas também a cultura e o modo de viver de cada povo.”

Na comunidade Yamado, onde vive com a família, Irineu mantém a tradição e incentiva os filhos a falarem o idioma Baniwa.

“Meus filhos falam Baniwa. Isso me dá orgulho, porque significa que eles reconhecem de onde vieram e quem são.”

Diferente dos dados apresentados pelo IBGE, o professor Irineu explicou que atualmente são faladas apenas 19 línguas na cidade de São Gabriel da Cachoeira e existem 25 etnias. Ele também questionou o levantamento atual do Censo de 2022, que não lista as línguas faladas na região.

Dados do Censo 2022

De acordo com o Censo Demográfico 2022, o Brasil possui 391 etnias indígenas e 295 línguas identificadas, faladas por 474.856 pessoas com dois anos ou mais. As línguas com maior número de falantes são: Tikúna (51.978), Guarani Kaiowá (38.658) e Guajajara (29.212). O levantamento também registrou idiomas falados por grupos menores e até por apenas uma pessoa. Em 2010, o IBGE havia identificado 274 línguas entre indígenas de cinco anos ou mais.

Em São Gabriel da Cachoeira, essa pluralidade permanece viva. O município é exemplo de resistência e valorização das identidades que compõem o mosaico linguístico e cultural da Amazônia brasileira.

Conforme dados do IBGE, São Gabriel é o segundo município com maior percentual de indígenas. Manaus é o município e a capital com maior número de pessoas indígenas, segundo explicou o supervisor estadual de Disseminação de Informações do Instituto, Adjalma Nogueira Jaques.

Línguas faladas

Os municípios que reúnem a maior diversidade de línguas faladas são Manaus/AM, com 97 línguas declaradas, seguido de São Paulo/SP, com 77, seguido da capital federal, Brasília/DF, com 60 línguas declaradas.

Fora das capitais, São Gabriel da Cachoeira/AM é o município com maior quantitativo de línguas declaradas, com 36 línguas, seguido de Altamira, com 33 e Iranduba/AM, com 31.

Considerando-se apenas as línguas indígenas faladas ou utilizadas por pessoas residentes em Terras Indígenas, esse quantitativo é de 368 municípios, sendo que em 19 deles 10 ou mais línguas indígenas são faladas ou utilizadas.

Ainda conforme o IBGE, São Gabriel da Cachoeira é o município que abriga a maior diversidade de línguas indígenas faladas ou utilizadas em Terras Indígenas, com 24 línguas, seguido de Bom Jesus do Tocantins, no Pará, com 22, e Pacaraima, em Roraima, com 19 línguas.

O Censo permitiu a declaração de até três línguas indígenas por pessoa, revelando regiões com forte multilinguismo, como o Alto Rio Negro, o Norte do Pará e o Parque do Xingu. A análise etária mostra que os falantes exclusivos de línguas indígenas são majoritariamente jovens, o que pode indicar potencial de continuidade.

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Censo 2022 aponta que o Brasil tem 391 etnias e 295 línguas indígenas; Amazonas é o segundo estado mais diverso

 

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