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Amazônia tem mais de 425 mil famílias sem energia elétrica

Painéis de energia solar instaladas na comunidade Volta do Bucho, na Reserva Extrativista Ituxi, em Lábrea (AM), por projeto do WWF-Brasil e ICMBio, em 2017. Foto: Carl de Souza/AFP.

Diferente da maioria das residências brasileiras, onde a eletricidade é considerada um recurso quase óbvio, em muitas localidades da Amazônia, crianças, adolescentes, adultos e idosos vivem sem um dos principais insumos para o desenvolvimento das atividades produtivas, educacionais e de lazer. Segundo estimativas do Ministério de Minas e Energia, cerca de 425 mil famílias ainda não têm acesso à energia elétrica. Sem a realização do Censo do IBGE, esse dado pode estar subestimado.

O ano de 2022 é o ano chave para a pauta da universalização da energia elétrica no Brasil, quando vence o prazo de vigência do Luz para Todos, o carro-chefe da política pública desse direito garantido pela Constituição. Seu irmão mais novo, o Mais Luz Para a Amazônia, lançado em 2020 e que também perde a vigência em 2022, deverá ser prorrogado. O projeto  foca justamente nas populações que o Luz Para Todos não conseguiu atingir em sua plenitude: os moradores de áreas remotas da Amazônia Legal.

“Quando o Programa [Luz Para Todos] começou a existir, em 2003, existia uma estimativa de demanda pelas distribuidoras, e a medida que o programa foi se desenvolvendo, se descobriu que o país tinha uma população sem energia elétrica muito maior que indicava o Censo do IBGE ou mesmo o cadastro das distribuidoras”. diz Paulo Gonçalves Cerqueira, diretor do Departamento de Políticas Sociais e Universalização do Acesso à Energia Elétrica do Ministério de Minas e Energia, em audiência realizada em maio de 2021 na Câmara dos Deputados. Desde 2004, o Luz para Todos atendeu 3,5 milhões de famílias, são mais de 16.8 milhões de pessoas no país ligadas à rede de energia.

No ano passado, o Ministério de Minas e Energia estimou que faltava adicionar 206,5 mil famílias na rede interligada pelo Programa Luz Para Todos – ou seja, puxar poste, linhão até a comunidade e ligá-la na rede –, e mais 219 mil famílias dentro do Sistema Isolado, pelo Programa Mais Luz Para a Amazônia, onde o atendimento energético acontece por meio de sistemas de pequeno porte, com geração descentralizada de energia como, por exemplo, energia solar. Ao todo, 450 mil famílias na área rural do país ainda estão sem poder ligar a tomada. Em contrapartida, nas áreas urbanas, o Brasil conseguiu universalizar o acesso à rede elétrica antes da virada do século.

“Podemos dizer que o Mais Luz Para a Amazônia é a terceira versão de programas de universalização da energia elétrica no Brasil, se considerarmos o Luz no campo (2000) e o Luz para Todos (2003). Ele trouxe aprimoramentos para a região amazônica e incorporou a questão das demandas produtivas. Entende que é necessário suprir a energia não só para fins residenciais, mas para as demandas produtivas das populações. Ele tem um foco também na Energia Solar, essa foi outra diferença. O programa entende que a energia solar é a energia de “prateleira”, ou seja, a mais fácil de ser implementada, a mais ampla em termos de potencial, de facilidade, de manutenção, enfim, todos esses quesitos técnicos e econômicos, além de ser a mais barata para a maioria dos locais”, analisa Ricardo Baitelo, doutor em planejamento energético e gerente de projetos no Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA).

O Programa Luz Para Todos finaliza suas atividades no final de 2022. O Ministério de Minas e Energia prepara uma proposta de prorrogação do programa Mais Luz Para a Amazônia, que será encaminhada à Presidência da República. Ainda há dúvidas sobre sua continuidade e sobre como ele será operado diante da privatização em curso da Eletrobrás, responsável pelos dois programas de universalização de energia.

219 mil famílias esperam atendimento do Mais Luz Para a Amazônia

Segundo os dados da ANEEL apresentados na audiência da Câmara, o estado do Pará tem a maior quantidade de famílias sem acesso à energia elétrica: 154,8 mil; seguida do Amazonas, com 33 mil famílias; Acre, com 17 mil; e Roraima, com 7,7 mil famílias. Na Amazônia Legal, o Tocantins é o estado com a situação mais confortável, com apenas 586 famílias identificadas sem acesso à energia. Das 221 mil famílias amazônicas que vivem sem eletricidade, 32,8 deverão ser atendidas até o final deste ano.

O Programa Mais Luz Para a Amazônia (MLA) atende novas famílias que ainda não têm energia em casa e promove a substituição de geradores de energia à diesel ou à gasolina, que hoje são a única fonte de energia  para muitas famílias que vivem nessas regiões remotas.

Segundo o Ministério de Minas e Energia (MME), o orçamento deste ano destinado para a universalização é de R$1,138 bilhão. Para atender toda a demanda atualmente levantada dentro do Programa MLA, ou seja, as 219 mil famílias, estima-se que será necessário investir um total de 10 bilhões de reais.

A dificuldade da estimativa vem do fato das ocupações serem dinâmicas. “Isso acaba sendo mais um gargalo, [pois] não há um conhecimento exato de onde estão essas populações, esse é um dado dinâmico, [visto que] as populações migram, e é um dado que está sempre desatualizado”, explica Ricardo Baitelo, gerente de projetos no Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA).

O IEMA tem um levantamento, de 2020, com  dados georreferenciados sobre onde está  localizada a população em áreas remotas sem acesso à rede elétrica. Segundo a pesquisa, chega a 990 mil o número de moradores da Amazônia Legal sem um ponto de energia.

Os excluídos

A metodologia do IEMA considerou dados sobre a infraestrutura existente dentro de áreas isoladas, onde vivem, principalmente, povos tradicionais como ribeirinhos, quilombolas, povos indígenas e extrativistas, e assentados.

A análise foi realizada em duas etapas, tendo como principais fontes de informações o SIN – Sistema Interligado Nacional (o sistema que atende a maior parte da população brasileira e conta com as maiores usinas do país, incluindo Itaipu) e os Sistemas Isolados, que são centros produtores de energia não conectados ao SIN, que se concentram na região Norte.

Os dados obtidos dos sistemas de geração e distribuição elétrica foram cruzados com estimativas da população feitas com base no Censo de 2010 e nas estimativas populacionais anuais, do IBGE.

A pesquisa coincide com os dados da Aneel e coloca o Pará como o estado que tem a maior quantidade de cidadãos nesta situação: são mais de 409 mil moradores sem uma tomada energizada por alguma companhia elétrica, ou seja, 9 Mangueirões (o maior estádio de futebol paraense) lotados em sua capacidade máxima atual.

Entretanto, o melhor retrato para comparação entre populações é uma análise proporcional.  E aí, quem assume a dianteira é o estado do Acre, que apesar de ter cinco vezes menos habitantes que o Pará nesta contagem do blecaute involuntário, tem 10% de sua população ainda sem energia.

“Eu já visitei comunidades que coincidentemente receberam acesso, há uns bons anos, por energia solar em mini redes. Então nessas comunidades a discussão era um pouco interessante, porque elas tinham muito claro que o uso do diesel não vale a pena pelo altíssimo custo, pelo barulho e também pela poluição. Essas comunidades estavam, naquele momento, começando a ter a experiência de ter energia, mas ao mesmo tempo sabendo que essa energia não era um acesso ilimitado, era um acesso ainda que tinha sido instruído pela Eletrobrás como restrito para as principais atividades. Esse é outro ponto que tem que ser endereçado: qual seria o acesso”, diz Baitelo.

Sala de aula em uma escola em Cassiana, na Reserva Medio Purus, que se beneficiou de painéis de energia solar instalados pelo World Wildlife Fund (WWF), na região, em 19 de setembro de 2017. Foto: Carl de Souza/AFP.

“Hoje, o Mais Luz Para a Amazônia e o Luz Para Todos estão garantindo o primeiro contato dessas pessoas com a energia, e posteriormente, elas vão começar a pagar essa conta de luz, mas isso não significa que a demanda reprimida vai embora e que elas poderiam estar utilizando a energia para mais fins e podendo exercer atividades produtivas”, analisa.

 

*As informações são do portal O Eco 

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