*Da Redação Dia a Dia Notícias
O Ministério Público Federal (MPF) recomendou que, pelo menos, 30% dos alimentos da merenda escolar da rede estadual de ensino sejam adquiridos da agricultura familiar. A medida é prevista na Lei n. 11.947/2009 e determina que haja prioridade na compra da produção de assentados da reforma agrária, povos tradicionais indígenas e quilombolas.
A recomendação foi encaminhada à Secretaria de Estado de Educação e Desporto (Seduc), indicando a necessidade de lançamento de uma nova chamada pública diferenciada para aquisição de itens da merenda escolar que contemple os povos tradicionais – indígenas, ribeirinhos, quilombolas e extrativistas – garantindo o respeito à alimentação culturalmente adequada nas escolas indígenas e tradicionais em geral.
O MPF destaca, no documento, que a Seduc também deve promover o amplo acesso à Nota Técnica n. 01/2017/ADAF/SFA-AM/MPF-AM, à Nota Técnica nº 3/2020/6ªCCR/MPF e à Nota Técnica n. 09/2021/SAF/MAPA, ressaltando que o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e o Centro Colaborador em Alimentação e Nutrição do Escolar (Cecane) da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) disponibilizam o apoio técnico e orientações para realização das chamadas públicas diferenciadas.
Participação de povos e comunidades tradicionais
Na recomendação, o MPF aponta que houve avanços que permitiram que povos e comunidades tradicionais acessassem as políticas públicas, especialmente a partir da criação da Comissão de Alimentos Tradicionais dos Povos no Amazonas (Catrapoa), que se reúne periodicamente desde 2016 com órgãos municipais, estaduais, federais, sociedade civil, lideranças e movimento indígena e de comunidades tradicionais para debate de medidas e implementação de políticas públicas que garantam a efetiva aplicação da Lei n. 11.947/2009 e uma alimentação escolar tradicionalmente adequada a estes povos.
Apesar dos avanços, ainda existem entraves a serem sanados, especialmente em relação à adequação dos editais, como ocorreu na Chamada Pública n. 03/2021 da Seduc/AM. Vários problemas foram apontados pelos membros da Catrapoa e pelos agricultores familiares dos povos tradicionais, como ausência de informações referentes às quantidades de produtos por escola no edital, que dificulta o planejamento da entrega e da logística necessária por parte dos povos e comunidades tradicionais; inexistência da listagem de todas as escolas localizadas em territórios onde vivem povos indígenas e comunidades tradicionais; solicitação de certidões e realização de cadastro, como no Centro de Serviços Compartilhados (CSC), que não são necessários para habilitação ao chamamento público, apenas em momento posterior, quando da entrega dos produtos e emissão de nota fiscal; e falta de transparência sobre a pesquisa de preços que origina o valor estipulado dos produtos nas chamadas públicas, muitas vezes incoerentes com a realidade local.
Chegou-se à situação inadequada de ser lançada chamada pública pela Seduc e haver apenas poucos produtores tradicionais contemplados em todo estado do Amazonas, sendo grande parte das propostas dos produtores tradicionais indeferidas sem sequer haver contato prévio pela Seduc, nem articulação para solução das pendências. Mesmo o órgão estadual de educação participando frequentemente da Catrapoa e conhecendo o contexto de dificuldades dos povos e comunidades tradicionais para acesso à política pública com suas burocracias, não foram adotadas medidas concretas para contemplar esta realidade e inserir de fato estas populações.
Por conta disso, o MPF recomendou à Seduc a criação de um mecanismo, como um comitê gestor, para tratar sobre as lacunas e observações apontadas pelos membros da Catrapoa para acompanhar todo o processo da chamada pública e garantir a maior participação de povos e comunidades tradicionais.
De acordo com a recomendação, o comitê poderá ser composto por técnicos da Seduc e por membros da Catrapoa, entre outros, que se reunirão sempre que necessário. As memórias da reunião devem ser encaminhadas ao MPF e demais membros da Catrapoa para monitoramento.
O MPF estabeleceu prazo de 30 dias para prestação das informações sobre as medidas recomendadas, devendo a Seduc encaminhar ao órgão relatório com datas, cronograma e meios para o cumprimento.