Todos os Estados irão perder de 30% a 45% de arrecadação e em Manaus não deverá ser diferente. “Isso aconteceu por um motivo muito simples: a economia implodiu e uma economia assim não arrecada. O setor industrial brasileiro que já estava atrás em termos competitivos com outros países, agora será massacrado pela realidade da China”, afirma o economista Paulo Gala, mestre e doutor em Economia pela Fundação Getúlio Vargas.
A saída para o atual cenário de crise, segundo ele, é uma articulação do poder público usando a iniciativa privada para a contratação de obras públicas em todas as frentes, mas, principalmente, em infraestrutura e na produção de equipamentos e insumos para o setor de Saúde.
O autor do livro “Brasil, uma economia que não aprende”, escrito em parceria com Andre Roncaglia, participou do programa Economia em Debate, feito como projeto de extensão da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) em parceria com o Conselho Regional de Economia do Amazonas (Corecon-AM).
“Precisamos de uma ação ao estilo do que ocorreu no ‘New Deal’ quando o Estado fortalece a iniciativa privada que, por sua vez, fortalece o Estado. Esse círculo virtuoso que, hoje, acontece na China, é que faz a economia andar”, explica. Na ocasião da crise de 1929, o governo dos EUA adotou um amplo programa de intervenção na economia, o New Deal, que previa o investimento em um amplo leque de obras públicas para a geração de empregos como aeroportos, portos, rodovias, usinas hidrelétricas, entre outros, além de financiamentos do setor rural para quitar dívidas e voltar a produzir, e controle da produção industrial com a finalidade de se evitar acúmulo de estoques.
“Isso é que falta no Brasil, esse entendimento de que o Estado está aqui para nos ajudar, não para atrapalhar: o Estado é um instrumento de ação coletiva da sociedade, é canalização da força da sociedade que nesse momento se faz ainda mais necessário”, afirma Paulo Gala.
Questionado pelo apresentador Jefferson Praia, até onde a dívida pública brasileira pode chegar, se há um teto para o grau de endividamento, o economista da FGV explicou que a dívida pública é doméstica, sendo que as futuras gerações irão pagar, mas também irão receber. “É uma estrutura de débito e crédito: se a dívida pública aumenta, ao longo do tempo há uma transferência de renda dos devedores para os poupadores, ou de quem paga impostos para quem recebe juros da dívida. Serão brasileiros que irão carregar essa dívida pública e brasileiros que irão receber esses juros e, portanto, os beneficiados finais da tributação da dívida pública. Os recursos não serão drenados do país”, afirma.
A premissa de que “não há recuperação possível que não passe pela mão do Estado”, defendida por Paulo Gala, se dá em função do cenário que se tem em curto prazo: um déficit de mais de R$ 1 trilhão, ou seja, mais de 10% do Produto Interno Bruto (PIB), podendo chegar a 15%. “Não deixa de ser uma ironia do destino: time mais fiscalista da historia do Brasil vai praticar o maior déficit fiscal da história. Talvez por isso, venha agindo de maneira tímida quanto à ação direta na economia”, pontua.
O comportamento do empresário é defensivo na crise o que é perfeitamente compreensível, afirma o economista. “A iniciativa privada está acuada, no canto, é da lógica natural do sistema. Por isso, achar que a iniciativa privada ela vai capitanear a saída, não faz sentido. Os bancos não vão emprestar para quem está quebrado ou para as médias e pequenas empresas que não condizem com as garantias exigidas. É uma lógica natural. Para isso é que deveríamos usar a estrutura estatal que tem condições de fazer esse dinheiro chegar a quem precisa, via BNDES e Caixa Econômica; valorizar os canais públicos diretos não depender do setor privado”.
Sobre o conceito de desindustrialização defendido por Paulo Gala em um de seus artigos, o presidente do Corecon-AM, Francisco de Assis Mourão Jr, questionou sobre esse contexto no Brasil. “Nenhum país do mundo ficou rico sem se industrializar; é a rota para o enriquecimento. Quando o PIB per capita começa a ficar entre U$ 25 a U$ 30 mil, surge a desindustrialização que é pico da indústria: de altíssima tecnologia e muito produtiva, muito high tech, com mecânica de precisão e química fina. E aí isso migra para o setor de comércio, de serviços”, afirmou.
Paulo Gala disse ainda que, nos últimos anos, tem ocorrido uma desindustrialização precoce, que começa com U$ 10 mil dólares de renda per capta, casos brasileiro, argentino e de outros países da América Latina. “Neste caso, não conseguiu subir a escada tecnológica, mas começou a perder espaço para novos serviços. Não há desenvolvimento econômico possível sem indústria, ela é o coração tecnológico de uma economia: o setor de serviço aumenta por inovações industriais. Colheitadeira, drones, computador, são exemplos disso”.
Economia em Debate
Nesta quarta-feira, dia 27, o programa Economia em Debate recebe o economista Luiz Alberto Machado, que atua na área como professor e palestrante, além de ser escritor. Atualmente é diretor adjunto na Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial. Na ocasião, ele abordará o tema “A Crise do Covid-19 e a criatividade nos negócios”, a partir das 14h, no facebook do Corecon-AM.