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Retrospectiva: veja os filmes, séries, músicas e livros que brilharam em 2020

Como regra geral, na temporada pré-premiação do início do ano o cinema americano lança os títulos com os quais pretende colher prestígio — e, no segundo e terceiro trimestres, as produções com as quais faz o dinheiro grosso.

Nenhuma regra, porém, se aplica a 2020: não fossem os ingressos vendidos entre janeiro e março, mais a aventura quase isolada que foi a estreia de Tenet, e a renda total deste ano teria ficado mais perto do zero que dos cerca de 2 bilhões de dólares recolhidos até agora na bilheteria americana — algo como 10 bilhões abaixo da marca normal, e bem longe de cobrir os custos básicos dos estúdios.

O mercado internacional não oferece alento: mesmo antes de a segunda onda do coronavírus tomar a Europa, um número muito pequeno de espectadores se mostrara disposto a retornar às salas. Como em toda grande perda, esta aqui enseja alguma vitória: o streaming reinou absoluto em 2020, e entra em 2021 ainda mais forte.

Com o correr do tempo, também ele terá desafios inéditos por enfrentar. Mas o fato é que 2020 silenciou, à força, a rixa entre o cinema e o streaming: não só ele foi o anteparo contra um surto de falências, como detém a maioria dos candidatos naturais ao Oscar 2021. A Academia já havia dado seu reconhecimento implícito à Netflix, com as dez indicações ao Roma, de Alfonso Cuarón, em 2019, e a outra dezena de O Irlandês, de Martin Scorsese, em 2020.

Mas avalia-se que, em 2021, a Netflix pode quebrar o recorde que a MGM sustenta desde 1937, quando cinco de seus títulos disputaram o prêmio de melhor filme. Disparado na frente vem o Mank, de David Fincher. Entretanto, é no Oscar de 2022 que se verá de verdade o efeito da pandemia nessa briga: só o anúncio da Warner de que todos os seus títulos do próximo ano estrearão simultaneamente nos cinemas e na HBO Max já pode ser o suficiente para redesenhar a correlação de forças dentro da indústria.

O terremoto de magnitude sem precedentes que atingiu o cinema em 2020 não poupou outras frentes do entretenimento. O mercado musical teve de se agarrar às lives para compensar, ainda que minimamente, as perdas milionárias com o desaparecimento dos shows ao vivo. Com livrarias físicas fechadas, os lançamentos de livros igualmente se reduziram, e seu consumo pendeu de vez para os e-books. Confira nas próximas páginas os filmes, séries, discos e livros que brilharam — apesar do coronavírus.

CINEMA

1- MANK (Estados Unidos, 2020)

VIRTUOSISMO - Gary Oldman em Mank: o filme usa o presente para iluminar o passado — e fazer justiça a ele -
VIRTUOSISMO - Gary Oldman em Mank: o filme usa o presente para iluminar o passado — e fazer justiça a ele – Nikolai Loveikis/Netflix

Há quase trinta anos, desde que era o garoto prodígio de clipes como o Vogue, de Madonna, e de filmes-sensação como Seven e Clube da Luta, o diretor David Fincher gestava esta homenagem a Cidadão Kane — ou, precisamente, à figura conflagrada e nem sempre reconhecida do roteirista Herman J. Mankiewicz, que mergulhou nas suas próprias relações turbulentas com Hollywood e com a política dos anos 30 para dar a outro garoto prodígio — Orson Welles, então com 24 anos — a matéria-prima de seu clássico de 1941. Com seu virtuosismo técnico tão assombroso quanto discreto, manejando diálogos velozes e amparado por atuações soberbas de Gary Oldman, Amanda Seyfried, Lily Collins e Arliss Howard, Fincher faz de seu filme o palco das inovações estéticas e narrativas com que Cidadão Kane revolucionaria a linguagem cinematográfica — e, para reapresentá-las à geração da Netflix (que bancou o projeto e o exibe), filma como Welles filmou, em um preto e branco pictórico, em que áreas de luz e sombra contrastam entre si. Poucas vezes o presente foi de tal forma capaz de iluminar o passado, e de fazer justiça a ele.

2- TENET (Inglaterra/Estados Unidos, 2020)

TEMPOS ESTRANHOS - Tenet: a única superprodução a desafiar a pandemia -
TEMPOS ESTRANHOS - Tenet: a única superprodução a desafiar a pandemia – Warner Bros./.

“Detritos de uma guerra futura”: é assim que uma cientista descreve ao Protagonista (John David Washington) os objetos de comportamento inexplicável que ela coleciona: balas que se descravam da parede, objetos que sobem da gaveta para a mão. Cabe ao Protagonista descobrir quem está manipulando assim o curso natural das coisas, numa jornada que o diretor Christopher Nolan transforma em mais uma de suas vertiginosas explorações da percepção do tempo. Única superprodução de estúdio a ser lançada exclusivamente nos cinemas na pandemia, Tenet é, de certa forma, também ele um artefato de uma guerra futura que mal começou, e que promete reformular, em um único ano, mais de um século de cinema como o conhecemos.

3- TRÊS VERÕES (Brasil, 2019)

A crônica brasileira é populosa em caseiros, porteiros, secretárias e motoristas que viram testemunhas-chave em casos de corrupção e não raro se veem tratados como suspeitos. A diretora Sandra Kogut não poderia ter escolhido rosto mais cativante para simbolizar esses personagens do que o de Regina Casé: a atriz habita com naturalidade notável Madá, caseira de uma mansão de veraneio deixada na mão pelo patrão foragido, com o pai idoso dele e os outros empregados olhando para ela à espera de uma solução. Madá se vira: com a casa sob sua custódia, aluga-a para hóspedes, organiza passeios, usa o espaço como locação de comerciais. Rápido e bem-humorado mesmo quando é tocante, Três Verões resume em concisos 94 minutos uma multidão de males.

4- OS 7 DE CHICAGO (The Trial of the Chicago 7, Estados Unidos, 2020)

Aaron Sorkin, o mais atilado roteirista — e aqui também diretor — em atividade, comprime em duas horas uma das mais escandalosas farsas judiciais americanas: o julgamento de ativistas de tendências diversas pela violência que tomara os protestos durante a convenção de 1968 do Partido Democrata, em Chicago — violência que uma investigação federal já concluíra ter sido iniciada e perpetrada pela polícia. Marcado pela atuação grotesca do juiz Julius Hoffman (Frank Langella), por manipulações escancaradas e por micagens dos réus interpretados por Sacha Baron Cohen e Jeremy Strong, o episódio vem repleto de momentos cômicos. Nem tudo que é cômico, porém, é engraçado, argumenta Sorkin em sua agilíssima produção para a Netflix.

TELEVISÃO

1- O GAMBITO DA RAINHA (Netflix)

FENÔMENO CULTURAl - O Gambito da Rainha: a série primorosa se tornou a surpresa do ano — e fez o mundo se apaixonar pelo xadrez -
FENÔMENO CULTURAL - O Gambito da Rainha: a série primorosa se tornou a surpresa do ano — e fez o mundo se apaixonar pelo xadrez – Phil Bray/Netflix

Produtor de carreira ilustre, que inclui O Talentoso Ripley e O Americano Tranquilo, Bill Horberg juntou-se ao amigo de longa data Scott Frank para realizar uma paixão em comum: “um draminha de xadrez”, conforme descreveu a VEJA. Nem toda a experiência dos dois permitiu a eles antever a dimensão que O Gambito da Rainha viria a adquirir: a de um autêntico fenômeno cultural. Minissérie mais vista da breve mas movimentada história da Netflix, a adaptação do romance homônimo trata de Elizabeth Harmon (Isla Johnston na infância e Anya Taylor-Joy na juventude), uma órfã que se descobre um prodígio do xadrez e, por meio dele, reinventa a si mesma nos anos 60, a década da Guerra Fria. Exercendo, como na minissérie Godless (2017), as funções de criador, roteirista e diretor, Scott Frank se prova mais uma vez excepcional nas tarefas de escalar atores e de conjurar mundos tão críveis e convincentes que vê-los é como fazer parte deles. O Gambito da Rainha provocou uma nova febre do xadrez no mundo todo, mas é na resiliência de Elizabeth, no seu humor, na sua independência e no seu senso de aventura que a série ganha vida. “Acho que ela é a pessoa de que precisávamos neste ano”, resume Horberg.

2- THE CROWN (Netflix)

Poucas são as séries que, a cada temporada, somam força em vez de dispersá-la. Mas, em seu quarto ano, o sempre superlativo drama de Peter Morgan ganha a melhor leva de episódios até aqui, com a entrada em cena de duas figuras que galvanizaram — e polarizaram — a Inglaterra dos anos 80: a primeira-ministra Margaret Thatcher (Gillian Anderson) e a jovem Diana Spencer (Emma Corrin), escolhida a dedo (e sem sucesso) como a mulher ideal para afastar o príncipe Charles (Josh O’Connor) de sua eterna amante, Camilla Parker Bowles. Costurando as rixas da família real com a onda concomitante de modernização econômica e insatisfação social no país, Morgan alarga ainda mais o escopo da série e prepara terreno para uma nova troca de elenco na quinta temporada.

3- NORMAL PEOPLE (Starzplay)

Em uma cidadezinha irlandesa, Marianne (Daisy Edgar-Jones) é a garota inteligente, esnobe e difícil, de quem os colegas mantêm distância; Connell (Paul Mescal) é o garoto doce e popular, que brilha no futebol. Ele é, também, o único que fala com Marianne sem que ela revide: Marianne é apaixonada por Connell, e a curiosidade de Connell por ela está a um passo de virar paixão também — a qual vai se concretizar em uma cena de sexo tão franca quanto inebriante. Mas, na irresistível Normal People, agora é que vem a parte difícil: o percurso acidentado que os dois vão percorrer — às vezes juntos, outras vezes separados, mas sempre na órbita um do outro, obrigados a se confrontar com o papel que desempenham na própria infelicidade ou insatisfação.

4- TALES FROM THE LOOP (Amazon Prime Video)

Uma máquina-laboratório causa paradoxos inexplicáveis nas leis da física: dois rapazes que trocam de corpo, um homem que se encontra levando a vida que sempre desejou em um universo paralelo, uma garota que para o tempo. Mas o instigante aqui não é “o que”; é como os personagens reagem aos acontecimentos. Inspirada nos quadros do sueco Simon Stalenhag, em que gigantescas criaturas e estruturas mecânicas modificam cenários bucólicos, a série evoca uma cidadezinha americana a um só tempo futurista e passadista: robôs caminham pelas matas e vultos de aço sobressaem na paisagem, mas as casas são antiquadas e os celulares não existem. É o tipo mais gratificante de ficção científica: o que indaga em vez de responder.

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5- I MAY DESTROY YOU (HBO)

Arabella (Michaela Coel) é uma descolada escritora londrina que representa, dos pés à cabeça, os excessos e ambições dos millennials — a geração hoje em torno dos 30 anos. Ao ganhar evidência como influenciadora nas redes sociais, ela se lança como autora de livros, vira best-seller e recebe uma bolada para escrever o segundo. Próximo da entrega do trabalho, vem o baque: Arabella é drogada em uma balada e sofre abuso sexual. Ao longo de doze episódios concisos e bem amarrados, ela enfrentará as dores de seu trauma ora de forma dramática, ora por um prisma negacionista e irônico. Nessa luta, Arabella é acompanhada de amigos que, assim como ela, buscam amor e realização profissional em um mundo bem menos romântico do que idealizam. A série extrai muito de sua força da interpretação acachapante de Michaela, também autora do roteiro.

6- BOM DIA, VERÔNICA (Netflix)

SUSPENSE - Bom Dia, Verônica: uma trama de serial killer com DNA brasileiro -
SUSPENSE - Bom Dia, Verônica: uma trama de serial killer com DNA brasileiro – ./Netflix

Em um dia tenso na Delegacia de Homicídios de São Paulo, a escrivã Verônica (Tainá Müller) testemunha o suicídio de uma mulher. O caso a intriga, motivando o início de uma investigação paralela sobre vítimas que, como a jovem suicida, teriam sido enganadas por um homem misterioso na internet. A trama, adaptada do romance policial homônimo de Raphael Montes e Ilana Casoy, cresce exponencialmente em ritmo e reviravoltas quando a protagonista recebe o telefonema de Janete (Camila Morgado), que acusa o marido, Brandão (Eduardo Moscovis), de crimes terríveis. Sem os pudores da TV aberta, que pouco explora o suspense e o terror, a série cativa ao destrinchar as mazelas da violência doméstica de forma crua, lado a lado com a caçada a um serial killer.

MÚSICA

1- FOLKLORE, de Taylor Swift (Universal Music)

NOVO RUMO - Taylor: ela abandonou um disco pronto e fez dois novos na pandemia -
NOVO RUMO - Taylor: ela abandonou um disco pronto e fez dois novos na pandemia – Reprodução/Instagram
Folklore
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A cantora americana não tem o hábito de largar pontas soltas na carreira. Acostumada a planejar tudo nos detalhes, ela já tinha um novo disco pronto quando a pandemia irrompeu. O problema: o trabalho ia na direção contrária aos humores do momento. Corajosa, Taylor abandonou o projeto e começou outro do zero, em segredo, enfurnada em casa. Nas redes sociais, justificou a decisão: “Nada está garantido”. Diferentemente do pop de seus últimos três álbuns, ou do country do início da carreira, Folklore é mais introspectivo e, como o nome diz, calcado no folk. As letras falam, sobretudo, de seus relacionamentos amorosos fracassados. O álbum entrou para o livro dos recordes como o disco feminino mais reproduzido em 24 horas no Spotify, com 80,6 milhões de streamings, e na Apple Music, com 35,47 milhões. No apagar das luzes de 2020, Taylor surpreendeu mais uma vez e lançou outro álbum, Evermore — uma sequência natural de Folklore.

 

 

2- ROUGH AND ROWDY WAYS, de Bob Dylan (Sony Music)

Rough and Rowdy Ways
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O 39º álbum de inéditas de Bob Dylan, o primeiro desde 2012 e também desde que ele ganhou o Nobel de Literatura, em 2016, comprovou a inventividade do compositor na maturidade. Aos 79 anos, ele entoa poemas longos e densos sobre a finitude da vida. A canção Murder Most Foul, de dezesseis minutos de duração, o alçou pela primeira vez ao pódio na parada americana, além de acumular mais de 4 milhões de visualizações no YouTube. Nos estertores do ano, Dylan fechou ainda um negócio milionário: vendeu à Universal Music, por 300 milhões de dólares, os direitos de mais de 600 canções, incluindo clássicos como Blowin’ in the Wind’ e Like a Rolling Stone.

 

 

 

3- GIL BAIANA AO VIVO EM SALVADOR, de Gilberto Gil e BaianaSystem (Máquina de Louco/Gegê Produções)

Gil Baiana
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Um dos gigantes da tropicália, Gilberto Gil compôs canções de protesto que marcaram gerações. Já o BaianaSystem é uma das mais inventivas bandas surgidas no país nos últimos anos. Em novembro de 2019, quando ainda era possível se aglomerar, eles se juntaram em um histórico show ao vivo em Salvador para reinventar ritmicamente os clássicos mais políticos de Gil. Pinçados a dedo, Nos Barracos da CidadePessoa Nefasta e Sarará Miolo soam mais atuais que nunca. Embora o álbum lançado em abril passado não seja de inéditas, a parceria traz um novo e originalíssimo frescor às canções.

LIVROS

1- TODAS AS CARTAS, de Clarice Lispector (Rocco; 864 páginas)

INTIMIDADE - Clarice: no ano de seu centenário, volume com cartas inéditas abre fresta para sua personalidade -
INTIMIDADE - Clarice: no ano de seu centenário, volume com cartas inéditas abre fresta para sua personalidade – Arquivo Pessoal/.
Capa Clarice
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É indissociável da aura mítica de Clarice Lispector a combinação de personalidade misteriosa, que a própria dizia não entender, com textos por vezes tão imperscrutáveis que chegam a ser classificados como herméticos. Assim, o livro que reúne quase 300 cartas assinadas por ela, datadas de 1940 a 1977, se mostrou um compêndio saboroso no ano de seu centenário de nascimento, celebrado em 10 de dezembro. As correspondências trazem textos inéditos, trocados com autores como João Cabral de Melo Neto, além de vislumbres de seu processo criativo. É na ampla correspondência com as irmãs, porém, que se revela o olhar afiado de Clarice. Escritas nas duas décadas em que ela, então mulher de diplomata, viveu fora do Brasil, essas cartas tratam dos absurdos do cotidiano e das banalidades da vida. A habilidade de observar o melhor e o pior do ser humano é uma marca que fez de Clarice não só uma exímia autora de romances, mas palpitante cronista e contista.

 

 

2- A VIDA MENTIROSA DOS ADULTOS, de Elena Ferrante (tradução de Marcello Lino; Intrínseca; 432 páginas)

A vida mentirosa dos adultos
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Caso raro em que prestígio e popularidade convergem, Elena Ferrante voltou a explorar as agruras do amadurecer feminino e as camadas sociais de Nápoles, em sua Itália de origem, no livro que será vertido em série pela Netflix. Ao ouvir o pai compará-la à irmã que ele detesta, Giovanna entra em crise, para então se reconstruir de forma independente rumo à vida adulta. No processo, busca novas referências e experiências, enquanto descobre as mentiras mencionadas no título. Um belo romance da autora de A Amiga Genial.

 

 

 

 

 

3- TRÂNSITO, de Rachel Cusk (tradução de Fernanda Abreu; Todavia; 200 páginas)

Trânsito
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São notáveis as semelhanças entre Rachel Cusk e Faye, protagonista de Trânsito, segundo livro da trilogia iniciada com Esboço (2014). Ambas se mudam para Londres após o divórcio e ensinam escrita criativa, por exemplo. A conexão autobiográfica, porém, é irrelevante. Independentes entre si, os livros trazem um olhar perspicaz sobre o outro. Pouco se sabe sobre Faye, que descreve de forma saborosa conversas com tipos que vão de um corretor de imóveis a uma taróloga. Com sua prosa cheia de ironia e pitadas filosóficas, Rachel é uma narradora envolvente — e viciante.

 

 

 

 

 

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