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Refinarias suíças prometem acabar com importação de ouro ilegal de Terras Indígenas brasileiras

O garimpo na Terra Indígena Munduruku resultou em desmatamento, poluição da água, contaminação por mercúrio e uma onda de violência contra indígenas. Foto: Marcos Amend/Greenpeace (maio de 2020).

*Da Redação do Dia a Dia Notícia 

Refinarias de ouro da Suíça, que estão entre as maiores do mundo, se comprometeram a não importar ouro proveniente de territórios indígenas da Amazônia brasileira, numa declaração inédita que ilustra o crescente escrutínio envolvendo material procedente da floresta. A Suíça é o segundo maior comprador do ouro brasileiro, atrás apenas do Canadá. Importou do Brasil 24,5 toneladas do metal precioso em 2021.

O país europeu também abriga algumas das principais refinarias de ouro do mundo – Metalor, PX Précinox, Argor Heraeus, MKS Pamp e Valcambi.

No final de julho, essas refinarias assinaram uma declaração pública em que condenam o garimpo ilegal e se comprometem a rastrear e identificar a origem do metal precioso para evitar o processamento de ouro extraído ilegalmente de Terras Indígenas da Amazônia brasileira.

Também assina a declaração a Associação Suíça de Fabricantes e Comerciantes de Metais Preciosos (ASFCMP), que responde por 95% dos metais fundidos e refinados na Suíça – 90% dos quais é ouro. De acordo com o Conselho Federal Suíço, o mais alto órgão executivo do país, mais de dois terços do ouro negociado em todo o mundo passa pela nação europeia.

O documento foi elaborado em parceria com uma delegação amazônica – independente do governo brasileiro – que foi a Berna em maio para se reunir com os representantes das principais refinarias suíças. O grupo, composto de lideranças indígenas e de comunidades tradicionais, advogados e pesquisadores, enfatizou como as refinarias desempenham um papel crucial numa cadeia produtiva que devasta a floresta e as pessoas que dela dependem para sobreviver.

“Esse ouro chega aqui na Suíça cheio de sangue. O Estado brasileiro é culpado pelas mortes que ocorrem em nossos territórios, e vocês que compram também são”, declarou Maria Leusa Munduruku, presidente da Associação de Mulheres Munduruku Wakoborũn.

A ativista sofreu represálias por sua luta contra o garimpo, e teve sua casa e parte de sua aldeia incendiadas por pessoas ligadas aos garimpos em 2021. “Eles tocaram fogo, nos ameaçaram com arma de fogo e atiraram nos pés dos meus filhos”, relatou aos representantes da indústria do ouro.

Uma pesquisa realizada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) identificou níveis de mercúrio acima do limite considerado seguro pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 60% da população de três comunidades Munduruku. Além de causar distúrbios neurológios, doenças cardíacas e até câncer, o mercúrio também pode ultrapassar a barreira placentária e atingir o cérebro do feto, causando danos irreversíveis.

“Em nome do desenvolvimento, não é possível mais matar as nossas crianças, as nossas mulheres e tampouco ignorar os sinais que a natureza tem dado”, disse Luiz Eloy Terena, coordenador jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), que também integrou a delegação. O advogado indígena relatou o caso de uma adolescente de 12 anos que foi sequestrada, estuprada e assassinada por garimpeiros na Terra Indígena Yanomami. Desde 2019, a maior reserva indígena do país, no estado de Roraima, tem sido sistematicamente invadida. Calcula-se que, hoje, haja mais 20 mil garimpeiros ilegais no território onde vivem quase 27 mil indígenas.

Atentos às denúncias feitas inicialmente por Maria Leusa e Luiz Eloy, os representantes das refinarias suíças reconheceram a gravidade dos impactos, mas afirmaram não comprar ouro da Amazônia. Dados oficiais relativos às exportações brasileiras, entretanto, mostram o contrário: pelo menos um quinto do ouro exportado para a Suíça em 2021 saiu de estados amazônicos. “Vimos que, dentro dos últimos dois anos, mais ou menos cinco toneladas do ouro oriundo de Itaituba [no estado do Pará] e Pedra Branca do Amapari [no estado do Amapá] vieram diretamente para a Suíça”, disse Christoph Wiedmer, codiretor da Sociedade para Povos Ameaçados, ONG suíça que articulou o encontro entre os empresários e a delegação amazônica.

Quase todo esse ouro foi ilegalmente extraído, mas a falta de transparência ainda ronda o setor, tanto na Suíça como no Brasil. “As refinarias sempre disseram que não importam ouro sujo. Então agora temos as provas de que o ouro saiu, mas não sabemos para onde foi exatamente”, explicou Wiedmer.

No Brasil, a lavagem do ouro ilegal é relativamente simples, e dá ao comércio um verniz de respeitabilidade.

Um levantamento feito pela Universidade Federal de Minas Gerais em parceria com o Ministério Público Federal (MPF) concluiu que, de 30,4 toneladas de ouro produzidas no estado do Pará entre 2019 e 2020, ao menos 17,7 toneladas (58,4%) foram extraídas com falsa indicação de origem.

Globalmente, a extração de ouro chegou a 3.300 toneladas em 2019. O maior produtor foi a China, com 380 toneladas, seguido pela Austrália, com 325, e a Rússia, com 305. O Brasil aparece com produção de 90 toneladas, e o Peru, com 128 toneladas.

Um relatório da organização WWF calcula que entre 50% e 70% de todo o ouro negociado no mundo transita fisicamente pela Suíça – cifras que a indústria contesta, dizendo que tudo depende da definição usada, se é ouro extraído das minas ou lingotes ou de outra forma.

Segundo WWF, boa parte vem de países que não produzem o metal precioso, como o Reino Unido (importações de 130 toneladas), Emirados Árabes Unidos (128 toneladas) ou Itália (68 toneladas), por um sistema comercial com múltiplas facetas que impedem de assegurar a rastreabilidade do ouro.

*Com informações da agência Mongabay e Valor Econômico. 

 

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