O abismo econômico entre brancos e negros no Brasil pouco mudou nos últimos anos, mesmo com o aumento dos debates sobre como as empresas e a sociedade podem diminuir essa desigualdade. Segundo levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica (IBGE), em 2019, a população branca recebeu, em média, 56,6% a mais que a população negra — como comparação, em 2012, início da série histórica, o rendimento médio mensal dos brancos foi 57,3% maior que o dos negros.
Os dados do instituto mostram que as pessoas negras são minoria em áreas que exigem maior qualificação, como informática (31%), arquitetura e engenharia (26,9%) e em cargos de gestão empresarial (23,6%). Para diminuir essa enorme diferença de oportunidades, o cientista social Vitor Del Rey, de Nova Iguaçu, Rio de Janeiro, criou o grupo do Facebook “A Ponte Para Pretxs”, o qual teve início após ele ser procurado frequentemente para indicar pessoas negras a vagas em empresas.
O que nasceu com um espaço para Vitor divulgar cargos fixos, de estágio e de intercâmbio, com 140 pessoas no total, se transformou em uma rede de 33 mil pessoas atualmente. É o maior grupo de compartilhamento de oportunidades da América Latina.
Com o tempo, o mestrando da Fundação Getúlio Vargas (FGV) percebeu que, mesmo com as indicações de emprego e a grande maioria do grupo ter concluído o ensino superior, a minoria de fato conseguia uma vaga formal. Isso por causa da falta de oportunidades de qualificação em cursos, geralmente caros, como power B.I, design think, UX design, branding, storytelling, entre outros. Foi então que ele deu um passo além e criou a Escola da Ponte Para Pretxs, na qual oferece uma grande variedade de cursos, totalmente gratuitos, a pessoas negras.
Como podemos melhorar suas vidas por meio desses recursos? Com esta premissa, ela fundou há três anos o Movimento Black Money, junto com seu sócio Alan Soares, no qual utiliza a experiência de ambos para apoiar empreendedores negros e negras em seus negócios para oferecer autonomia a essa população no Brasil, com pontes e influência junto a outros países.
De acordo com Nina, o grupo no Facebook do Black Money possibilita que a comunidade negra encontre interesses em comum e trate de assuntos relevantes, como o combate à desigualdade racial, de maneira segura e sem ataques. Na rede, o movimento também lança novos produtos e ações para ter a divulgação necessária.
“Há uma rica troca entre os participantes em diferentes assuntos, mas com a pauta central do Black Money, ou seja, como girar mais riquezas entre a comunidade negra. Atualmente, temos um marketplace com mais de 400 lojistas e essa rede serve como porta de entrada e canal de divulgação a esses afroempreendedores”, declara.
Vitor Del Rey: A Ponte Para Pretx
Criado em uma família evangélica, Vitor Del Rey é filho de uma mãe preta solo. Ele cresceu em uma comunidade chamada Caminho do Manhoso, onde viveu até os 23 anos. Por estar no contexto religioso, não vivenciou muitas coisas que seus amigos e demais conhecidos passaram durante a adolescência. Tudo o que fazia era estudar e jogar futebol. Durante o segundo grau, o profissional tinha uma rotina exaustiva: acordava às 4h para chegar ao trabalho às 6h; depois, estudava e voltava para casa às 0h.
Ao terminar a escola, saiu do emprego e descansou durante um ano. “Na minha igreja, sempre que alguém passava no vestibular, a pessoa ia com os pais na frente de todos para orar. Queria dar essa alegria para minha mãe”, relata.
Quando era funcionário de uma empresa de clipagem, percebeu que toda vez que algo importante acontecia no Brasil, para o bem ou para o mal, convidavam alguém da Fundação Getúlio Vargas para comentar o assunto. “Pensei: esse lugar deve formar as pessoas mais inteligentes do Brasil”, afirma.
Após conselho de um amigo, pesquisou na internet um curso pré-vestibular para negros. Entre as opções, a primeira foi a Educafro, então, ligou para o local e recebeu a orientação para participar de uma reunião no dia seguinte. Para Vitor, aquele momento foi muito especial, talvez um dos mais importantes de sua vida, pois o encontro abordou a história do negro no Brasil e mostrou por que ele estava naquele lugar pleiteando uma bolsa de estudos.
“Aquilo me trouxe sentido: de direção e espiritual. Me reconectou com minha ancestralidade”, lembra. Mais do que ganhar a bolsa, a experiência representou a causa que teria de lutar de lá para frente.