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Produção de biocosméticos é alternativa ao garimpo para mulheres no Amapá

Foto: Maurício de Paiva.

No Alto Araguari, interior do Amapá, um foco de retomada da cultura popular abre janela para a valorização do conhecimento ancestral, colocando os povos residentes no seu lugar de direito. Um grupo de quase 30 mulheres faz uso sustentável dos recursos naturais produzindo biocosméticos, garantindo renda e qualidade de vida para os ribeirinhos.

A Associação Sementes do Araguari fundada em 2020, durante a pandemia, é resultado de anos de luta dos moradores, que passaram por período de instabilidade após a extinção de um garimpo que operava desde 1974 no local. O encerramento da atividade, em 2009, gerou um impacto socioeconômico imediato na realidade das pessoas.

Fernanda Brandão, analista ambiental do ICMBio, esclarece que o fechamento do garimpo Capivara provocou um hiato na vida das famílias, que precisaram se readaptar. “Nosso intuito, como órgão responsável pelo fim da prática ilegal, era o de apresentar outras possibilidades para que a comunidade pudesse decidir, dentro do seu território, o que tem valor e o que deve ser cuidado”, afirma.

Na busca por alternativas, mães, tias e avós do lugar conceberam a ideia de produzir biocosméticos a partir da matéria-prima extraída das matas. Frutos e plantas como andiroba, pracaxi, breu-branco, copaíba e fava são utilizados na fabricação de sabonetes, pomadas, óleos in natura e velas repelentes. Só de sabonetes elas produzem cerca de mil por mês.

Segundo Arlete Pantoja, coletora de sementes e presidente da associação, o entendimento de que é possível explorar as riquezas sem impactar o ambiente mudou a forma de interação entre moradores e floresta. “A conquista de independência, salário e condições mais dignas era um sonho antigo, que descobrimos ser realizável por meio do convívio harmônico com a natureza.” As agroextrativistas contam também com três pontos de venda em Macapá, um na sede do ICMBio, localizado também na capital amapaense, e outro em Curitiba, além de participarem de feiras pelo Brasil.

Da coleta ao beneficiamento de extratos, o processo ocorre dentro de um ciclo de chuvas e cheias. São seis meses de maré cheia e seis de maré baixa. A coleta da andiroba, por exemplo, acontece dentro da água. É a correnteza que traz os frutos caídos das árvores para perto das casas dos ribeirinhos, onde serão recolhidos pelas crianças em paneiros.

Cada paneiro, um cesto trançado, de fibras, feito artesanalmente armazena cerca de 14 quilos de frutos. Ao passar pelo processamento na prensa das sementes, tal pesagem corresponderá a dois litros de óleo. Portanto, uma tonelada terá a medida de 300 litros. Em seguida, é realizada a mistura dos materiais, que são levados ao fogo, colocados em formas, depois congelados, embalados e acondicionados em basquetas, nos barcos, para transporte.

Linha de produtos da Sementes do Araguari. Foto: Associação Sementes do Araguari

Estefany Furtado, cientista ambiental e mestre em Biodiversidade Tropical pela Unifap, fala sobre a relação dos caboclos com as sementes: “Acho lindo como eles conhecem todas as plantas, sabem onde pisar, que árvores não sacudir, em qual delas tocar o terçado [grande facão] para fazer barulho ou chamar por ajuda. É uma relação de respeito com a natureza, mas também de necessidade. Eles precisam conhecer tudo para sobreviver, caçar, buscar plantas na floresta, fazer medicamentos. Naquele território, são eles os professores”.

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