O Pleno do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) do vôlei absolveu nesta segunda-feira a jogadora de vôlei de praia Carol Solberg. A atleta havia sido advertida por ter gritado “Fora Bolsonaro” durante entrevista ao vivo, na cerimônia de premiação da etapa de Saquarema (RJ) do Circuito Brasileiro do Vôlei de Praia, em setembro. No julgamento na primeira instância, dia 13 de outubro, Carol havia sido condenada por 3 votos a 2 com base no artigo 191 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva – “deixar de cumprir, ou dificultar o cumprimento de regulamento, geral ou especial, de competição”. Os auditores tinham aplicado multa de R$ 1 mil, convertida para advertência.
Mas nesta segunda, em novo julgamento, o Pleno do STJD derrubou a advertência pelo placar de 5 a 4. No início, a jogadora chegou a estar perdendo por 3 a 0, antes de ser absolvida por maioria de votos.
“Foi uma virada espetacular”, comemorou o advogado Leonardo Andreotti, ex-presidente do próprio STJD do Vôlei. Carol também foi defendida por Felipe Santa Cruz, atual presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
“A decisão foi reformada e, portanto, não há nenhuma penalidade à atleta”, completou Andreotti, em entrevista ao Estadão.
O julgamento estava marcado para começar às 14h30, mas um problema técnico atrasou o início da sessão para as 15 horas. Como aconteceu no julgamento da primeira instância, realizado pela 1ª Comissão Disciplinar do STJD, a sessão foi realizada on-line. Os auditores Eduardo Affonso de Santis Mendes de Farias Mello, Célio Salim Thomaz Junior e Vantuil Gonçalves votaram a favor de manter a advertência. Porém, Gilmar Nascimento Teixeira votou pela absolvição de Carol e foi seguido por Milton Jordão, Raquel Lima, Tamoio Athayde Marcondes e Júlia Costa.
O presidente do STJD, Alexandre Beck Monguillott, votou para manter a advertência quando a maioria a favor da atleta já estava formada (5 a 3).
“O julgamento de hoje no STJD do Voleibol, com os votos extremamente técnicos pela absolvição da atleta, escreve novo capítulo no mundo do Direito Desportivo e abre importante discussão acerca da compatibilização das normas públicas e privadas de natureza esportiva. O Brasil assume, com essa decisão, posição de verdadeira vanguarda no cenário internacional”, disse Andreotti à reportagem.
Depois de sofrer a advertência, Carol afirmou que se sentiu censurada pela decisão da primeira instância. O caso ganhou repercussão nacional e alimentou a discussão sobre declarações e manifestações de atletas sobre assuntos políticos e polêmicos durante eventos esportivos.
“Eu estava muito feliz de ter ganhado o bronze e, na hora de dar minha entrevista, apesar de toda alegria ali, não consegui não pensar em tudo o que está acontecendo no Brasil, todas as queimadas, a Amazônia, o Pantanal, as mortes por covid-19 e tudo mais, e meio veio um grito totalmente espontâneo de tristeza e indignação por tudo o que está acontecendo”, disse Solberg, antes do julgamento, ao comentar suas declarações no evento do Circuito Brasileiro de vôlei de praia.
O julgamento de Carol Solberg foi envolvido em polêmicas desde a denúncia. Na primeira instância, houve até adiamento porque a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e o Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) pediram para participar do caso. O relator Robson Luiz Vieira rejeitou o “pedido de intervenção”. As entidades recorreram, assim como Carol, mas não obtiveram êxito. Novamente, agora pelo Pleno, as partes não foram reconhecidas como “terceiro interessado”.
O caso pode servir para balizar se os atletas podem se manifestar politicamente ou não e, segundo especialistas ouvidos pelo Estadão, existe a possibilidade de quebrar o “muro do silêncio” no esporte brasileiro quanto a protestos políticos e também sobre outros temas em um momento em que vários esportistas ao redor do mundo têm levantado a voz para combater preconceitos e se posicionado com veemência em defesa do direitos humanos. Exemplo disso são os protestos antirracistas no futebol, no basquete e no futebol americano.
* Estadão