Search
booked.net
Search
Close this search box.

“O Brasil não conhece a Amazônia”, diz Ângela Mendes, filha de Chico Mendes

Coordenadora do Comitê Chico Mendes, criado em homenagem a seu pai, a ativista ambiental Ângela Mendes conta de que maneira tem preservado a memória do líder seringueiro e dado continuidade ao seu legado.
Divulgação

*Da Redação do Dia a Dia Notícia 

Foi aos 17 anos que Ângela Mendes passou a conviver mais de perto com seu pai, o seringueiro e ativista ambiental Chico Mendes. Nas pequenas viagens que ele fazia por Xapuri e região, e ela acompanhava, lembra-se da tensão e do cuidado de integrantes do Sindicato Rural de Xapuri em escondê-lo no carro para impedir possíveis ataques. Ao cabo de poucos meses, Chico Mendes foi assassinado.

Hoje, ela dá continuidade ao legado do pai por meio do Comitê Chico Mendes e entende que encampar a causa da Amazônia é mais do que militar só pelos povos da floresta: “Sigo acreditando no que dizia meu pai: no começo pensei que estivesse lutando para salvar seringueiras, depois pensei que estava lutando para salvar a Floresta Amazônica. Agora, percebo que estou lutando pela humanidade.”

Em entrevista ao portal Mongabay, ela também fala do papel das redes sociais como instrumento fundamental de resistência e convergência de lutas. Ela diz que são os “empates do século 21”, em referência às mobilizações de seringueiros no Acre lideradas por seu pai.

Ângela Mendes ainda reflete sobre causas e soluções para minimizar os conflitos e crimes por posse de terra, que colocam o Brasil no quarto lugar do ranking dos países que mais matam ativistas ambientais.

Como surgiu o Comitê Chico Mendes e de que maneira ele atua?

O Comitê nasceu na noite do assassinato do meu pai como uma estratégia de mobilização da sociedade para pressionar o governo a investigar e punir os assassinos. Naquela época, o cenário de impunidade era muito parecido com o que temos hoje. Dois anos depois da morte dele, mandante e assassino – que sabemos serem bodes expiatórios, porque as cabeças pensantes nunca foram sequer incomodadas – foram presos.

Outra missão que temos é a de manter e cuidar da memória e do legado do meu pai. Todo ano realizamos a Semana Chico Mendes, que acontece de 15 a 22 de dezembro (datas de nascimento e morte dele), quando mobilizamos a sociedade em torno do debate socioambiental.

O Comitê foi formalizado no ano passado, por conta da atual conjuntura política, com o objetivo de mostrar e fortalecer a nossa resistência e de ampliar a resistência dos jovens do território. Em 2016, inspirada na Carta Jovens do Futuro, eu criei o núcleo jovem do Comitê e começamos a ir em escolas da floresta e da cidade para fazer essa sensibilização ambiental nesses espaços também.

O que é a Carta Jovens do Futuro?

É um testamento que meu pai deixou aos jovens, falando dessa revolução socialista, dessa revolução que ele, os companheiros, companheiras, fizeram lá atrás, mas que precisava ser contínua. Uma revolução por um mundo melhor, mais justo.

A criação do núcleo jovem vem no intuito de dialogar com essa juventude. Muito embora eu tenha um espírito jovem, tem uma linguagem que eles usam, específica, que consegue comunicar e conectar, principalmente através da internet, que é um instrumento muito potente para unir vozes e lutas – algo importante de se fazer e sobre o que meu pai falava também.

A carta foi visionária, a gente percebe quando vê o tanto de jovens que estão envolvidos, engajados, militando e fazendo a defesa de causas, principalmente as causas pelo meio ambiente, pela preservação das florestas.

Uma das formas do Chico atuar era por meio dos empates, onde, por exemplo, barreiras humanas impediam a derrubada de árvores. O que são os empates atuais, em 2022?

As mídias sociais são um potente instrumento de resistência, são os empates do século 21. E estamos aprendendo muito com os coletivos indígenas nesse sentido. O que eles repercutem nas redes sociais tem uma força bem grande. O uso que fazem delas é responsável para que não estejam em uma situação pior. Por ali, conseguem incidir, do ponto de vista de pautar, judicializar, mas também constranger o governo atual, por exemplo, perante a sociedade internacional. E o fato de o presidente querer processá-los com frequência mostra que estão no caminho certo.

Para nós, das Reservas Extrativistas e dos territórios de uso coletivo, as redes sociais são úteis da mesma forma, uma ferramenta para denúncias e, também, divulgação das nossas narrativas – que vão contribuir para as estratégias de defesa da floresta.

A gente quer disseminar isso tudo para fora, para o mundo, mas também para dentro do Brasil. Aqui está mais difícil, porque temos muita gente que não acessa a internet. Precisamos ampliar esse acesso, sobretudo pelos jovens, para que eles possam criar outras formas de resistência e fortalecer seus territórios através dessa ferramenta.

Raoni e Ângela Mendes, filha de Chico Mendes, anunciam ‘Aliança dos Povos da Floresta’ contra ameaças do governo/ Imagem: Conexão Planeta

Chico Mendes ganhou reconhecimento, inclusive internacional, porque falava a partir daquilo que vivia, da sua realidade. Como aproximar a floresta, engajar as pessoas, para uma causa que elas muitas vezes não reconhecem como sua realidade?

Por exemplo através da campanha Amazônia de Pé, que o coletivo Nossas idealizou e da qual o Comitê Chico Mendes faz parte. O Brasil não conhece a Amazônia, e essa campanha é uma oportunidade muito boa para que o país conheça de fato a floresta, saiba pelo que ela está passando.

A Amazônia presta um grande serviço de regulação climática. Talvez as pessoas só percebam a sua importância quando começarem a sofrer diretamente os impactos da devastação que vem ocorrendo, como no dia em que São Paulo amanheceu com o ar cheio de fumaça.

Uma pesquisa do Datafolha disse que 90% dos brasileiros são a favor da floresta. Que isso se reflita em atos, sensibilidade e solidariedade, como por meio da adesão à Amazônia em Pé – que precisa reunir um milhão e meio de assinaturas para que o projeto seja recebido no Congresso. Também é necessário ter coerência nesse período eleitoral e mudar o cenário que está aí. A proteção à Amazônia precisa estar na pauta dos candidatos, de quem vai assumir.

*A reportagem é da Mongabay

Entre no nosso Grupo no WhatsApp

Antes de ir, que tal se atualizar com as notícias mais importantes do dia? Acesse o WhatsApp do Portal Dia a Dia Notícia e acompanhe o que está acontecendo no Amazonas e no mundo com apenas um clique

Você pode escolher qualquer um dos grupos, se um grupo tiver cheio, escolha outro grupo.