Search
booked.net
Search
Close this search box.

No Rio Amazonas, ribeirinhos e quilombolas resistem em meio à pandemia e à exclusão

A vida das comunidades ribeirinhas e quilombolas do entorno de Santarém, a maior cidade do Oeste do Pará, acontece às margens do principal rio da região Amazônica. É das águas do Rio Amazonas que eles tiram seu meio de sobrevivência.

Agora, além da constante luta contra a exploração das terras da região, as comunidades se veem mais uma vez sozinhas na batalha contra o vírus da Covid-19.

“A gente recorre à secretaria de saúde pública do município. Só que em muitos casos é muito tarde quando ela chega para prestar esse socorro. Nós já tivemos perdas, pessoas já faleceram porque não tiveram um tratamento adequado ou não foram socorridos”, conta Ricardo Aires.

Ele é morador da Comunidade de Membeca, região do Projeto de Assentamento Agroextrativista (PAE) de Lago Grande, distante cerca de 40km de Santarém.

Para acessar um serviço público de saúde, moradores das regiões ribeirinhas precisam, na maioria das vezes, ir até Santarém pela estrutura e complexidade do caso. Na comunidade de Membeca, somente o polo de uma UBS (Unidade Básica de Saúde) realiza atendimento.

Na maioria das vezes os pacientes precisam ser levados para os hospitais da região central que são acessados somente através do rio.

“Muitas das vezes tem que ir mesmo em transporte próprio. As chamadas ‘rabetas’, ‘tabajaras’ ou barco comercial que transporta passageiro. É assim que a gente tem chegado ao centro urbano para procurar socorro nos hospitais ou UBS do município”, relata.

Ricardo Aires afirma que uma das dúvidas sobre o diagnóstico da Covid eram as doenças endêmicas da Amazônia. (Imagem: Liege Costa)
Ricardo Aires afirma que uma das dúvidas sobre o diagnóstico da Covid eram as doenças endêmicas da Amazônia. (Imagem: Liege Costa)

Muitos dependem de embarcações pagas para atravessar o rio Amazonas, que funcionam com uma programação de horário próprio, o que torna o acesso a atendimento de saúde ainda mais desafiador.

Santarém com 18.265 casos, totalizados no dia 16 de junho, ocupa a 4ª posição de município do Pará com mais casos confirmados desde o início da pandemia, segundo o painel de COVID-19, da secretaria de Saúde Pública do Pará.

A comunidade, lembra Ricardo, que era acostumada a realizar mutirões de ajuda e trabalhos coletivos entre as famílias, sentiu uma grande solidão com a pandemia.

Além disso, os professores das escolas que estavam acostumados com as crianças e jovens da comunidade, sem o acesso a internet não conseguiram fazer muita coisa pelos seus alunos e a escola foi fechada.

“Porque quando uma pessoa adoece a tendência é sempre dos vizinhos irem ao encontro desse adoecido para fazerem uma visita, para levar um pouco de carinho. E nesse cenário da COVID-19 isso é muito complicado porque a gente não pode chegar perto, a gente não pode estar junto,” explica Ricardo.

Da outra margem do rio, quilombo Arapemã teve casos e desemprego

Jeferson dos Santos é morador da comunidade quilombola Arapemã, que também fica na margem oposta de onde se localiza Santarém. Ele viu de perto a rapidez com que o vírus se alastrou pela sua comunidade e levou parentes e conhecidos, conforme a reportagem do Yahoo Notícias.

“Quando a gente nem pensou já estava na nossa comunidade. Houve pelo menos 12 casos de COVID-19 na minha comunidade,” relata ele. Ao todo, vivem cerca de 70 famílias no quilombo.

Às margens do Rio Amazonas, as comunidades quilombolas e ribeirinhas de Santarém priorizam o transporte por barco e vias fluviais. (Imagem: Liege Costa)
Às margens do Rio Amazonas, as comunidades quilombolas e ribeirinhas de Santarém priorizam o transporte por barco e vias fluviais. (Imagem: Liege Costa)

Jeferson se viu sem saída depois que perdeu o emprego de coordenador do grupo de capoeira na escola da região, pelo projeto Mais Educação da Secretaria Municipal de Educação de Santarém. Foi aí que decidiu ir para Santarém, e passou a morar lá com a esperança de conseguir um trabalho.

“Eu acabei ficando desempregado e vim para Santarém em busca de emprego para melhorar. Procurar algo melhor até esse período de pandemia acabar”, conta ele.

A UPA mais próxima da comunidade fica também em Santarém. Quando chega lá, Jeferson conta que o paciente é levado até o hospital regional, onde recebia o devido tratamento e voltava para as suas comunidades para fazer o isolamento.

A comunidade de Arapemã, foi registrada no Livro de Cadastro Geral da Fundação dos Palmares em 01/03/2007, como uma comunidade auto-reconhecida, remanescente de quilombo.

Covid-19 se assemelha com doenças endêmicas da Amazônia

O Estado do Pará teve, no total, 548 mil casos confirmados de COVID-19. Dentre eles, 14.864 óbitos, sendo 57% de pessoas pardas, totalizando 313 mil, e 17,7 mil (3,2%) de pessoas pretas.

Ao todo, o estado tem 15.360 óbitos em decorrência da doença.

Pela semelhança com os sintomas de outras gripes, os moradores das comunidades ribeirinhas e quilombolas, na época do inverno da região e período de chuva, acabavam sem saber se estavam mesmo com a COVID-19.

A falta de acesso a essas informações acabou deixando os moradores ainda mais confusos.

“A gente tem recebido muita informação falsa. E por ser interior, ela ainda se confunde com outras doenças da região, de época. E isso tem dificultado. As famílias ainda não sabem muito como chegar ao médico e procurar outros recursos, até porque a relação no interior é muito diferente dos centros urbanos,” conta Ricardo.

Um dos meio de transporte alternativos para a comunidade quilombola Arapemã é um ônibus em condições precárias. (Imagem: Liege Costa)
Um dos meio de transporte alternativos para a comunidade quilombola Arapemã é um ônibus em condições precárias. (Imagem: Liege Costa)

Os sintomas mais descritos pelos infectados da Covid-19 no Pará:

  • Febre
  • Tosse
  • Dor de garganta
  • Dor de cabeça
  • Falta de ar
  • Coriza

Pará deve vacinar população adulta até final de setembro

Até o final de setembro de 2021, toda população adulta paraense, a partir dos 18 anos de idade, deverá ser vacinada com a primeira dose contra a Covid-19, no Pará.

O calendário de vacinação será organizado da seguinte forma:

  • Junho – Pessoas com idade entre 50 e 59 anos.
  • Julho – Pessoas entre 40 e 49 anos.
  • Agosto – Pessoas entre 30 e 39 anos.
  • Setembro – Pessoas entre 18 e 29 anos.

Até o momento, o Pará recebeu do Ministério da Saúde 3.327.390 doses de vacinas contra Covid:

  • 1.239.440 da CoronaVac
  • 1.994.350 da Oxford/AstraZeneca; e
  • 93.600 da Pfizer

Vacinação das populações indígenas e quilombolas no Pará

Segundo o Portal da Transparência da Prefeitura de Santarém, atualizado no dia 26 de junho, 84,5% da população indígena recebeu a 1° dose (totalizando 3.243 indígenas), e 68,2% recebeu a 2ª dose (totalizando 2.616 pessoas)

No entanto, mesmo há mais de 1 ano e meio de pandemia e mortes, somente 23,72% da população quilombola recebeu a 1ª dose da vacina — totalizando 1.608 pessoas —, dentre as 127 comunidades quilombolas no Pará.

Somente 4 pessoas de populações remanescentes de quilombos receberam a 2ª dose e estão totalmente imunizados.

Por que quilombolas e indígenas são grupos prioritários na vacinação no Brasil

Esses grupos fazem parte da 1° fase de prioridades no plano de vacinação lançado no começo deste ano..

Desde o dia 16 de dezembro de 2020, quando o governo federal apresentou o Plano Nacional de Vacinação contra COVID-19, grupos socialmente vulneráveis foram incluídos como prioridade no calendário da imunização.

Santarém (PA) oferece a estrutura de saúde que muitas populações do entorno necessitam. (Imagem: Liege Costa)
Santarém (PA) oferece a estrutura de saúde que muitas populações do entorno necessitam. (Imagem: Liege Costa)

Indígenas, quilombolas e moradores de rua são populações prioritários no calendário da campanha de vacinação. Em um país com alto índice de desigualdade social, a priorização do acesso para alguns grupos ainda gera questionamentos e é alvo de críticas.

A população indígena e quilombola está escalada para o recebimento ainda na primeira fase, quando divide a etapa com trabalhadores da saúde e idosos a partir de 75 anos.

Mesmo com as etapas definidas no último mês de 2020, os grupos sociais considerados vulneráveis socialmente ainda protagonizam números alarmantes nas projeções da infecção a nível de Brasil e, por consequência, complicações de saúde que levam a óbitos.

A co-fundadora da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (CONAQ) e pesquisadora das causas negras e quilombolas, Givânia Lima, reitera a importância da prioridade de acesso à vacina para estes grupos.

“O governo não fez, sequer, uma campanha de prevenção e cuidados com a doença exclusiva à população quilombola, por exemplo. Inclusive, o número de casos confirmados e pessoas acometidas pela doença só foi feito por intervenção da CONAQ e seus parceiros. Então, a vacina, como medida para frear a pandemia, deve ser direcionada à população que, historicamente, sempre esteve à margem do serviço público de saúde e outros direitos básicos, como a educação. Hoje, nós contamos com uma deficiência enorme do governo, então não contamos com as melhores expectativas”, afirma a pesquisadora.

 

Entre no nosso Grupo no WhatsApp

Antes de ir, que tal se atualizar com as notícias mais importantes do dia? Acesse o WhatsApp do Portal Dia a Dia Notícia e acompanhe o que está acontecendo no Amazonas e no mundo com apenas um clique

Você pode escolher qualquer um dos grupos, se um grupo tiver cheio, escolha outro grupo.