*Da Revista Cenarium
Natural de Manaus, o casal de publicitários, Elka Albuquerque e Luis Albuquerque, ambos 31 anos, decidiu trocar a vida estável com empregos para viver o sonho de viajar pelo mundo. Para isso, criaram o projeto “Do Norte ao Norte” e acharam no trabalho remoto a alternativa de gerar renda, mesmo durante a viagem.
Atualmente, o casal divide a rotina de conhecer lugares novos e ampliar a rede de amigos que vão fazendo ao longo do caminho e, de cumprir o deadline [prazo] dos jobs, além, é claro de se divertir e dirigir estrada afora.
O itinerário iniciou em Manaus, em 2016 e, desde então, o casal percorreu mais de 60 mil quilômetros e passou por mais de 300 cidades, registrando o roteiro cronologicamente em uma linha do tempo e postando nas redes sociais. Além, de inúmeros municípios brasileiros, eles conheceram países como, Argentina, Chile e Uruguai. No entanto, foram surpreendidos, no meio do percurso, pela pandemia de Coronavírus, que forçou o casal a retornar ao Brasil.
Uma das preocupações do casal era com a internet, o que acabou acontecendo durante a passagem deles pela Argentina, onde ficaram sem conexão e interrompendo o trabalho que eles realizavam remotamente. No Brasil e Uruguai, eles conseguiram utilizar o plano de uma operadora brasileira. Porém, por recomendação de outros viajantes, o casal adquiriu chips de diferentes empresas locais, por precaução.
Além disso, o casal trabalha com o veículo em movimento, porém, param se precisar. “Estacionamos o carro para trabalhar e entregar as demandas de acordo com o fluxo de trabalho”, destaca Elka.
O volume de trabalho é quem comanda o tempo que o casal fica parado no destino para que possam cumprir os prazos. Em Ushuaia, no extremo Sul da Argentina, por exemplo, eles permaneceram 28 dias em razão do alto fluxo de demandas de um cliente. “Era temporada de Black Friday. Ficávamos a semana toda trabalhando e nos finais de semana saíamos para fazer trilhas”.
Outra aspecto do casal era o lado financeiro e segundo eles, para dar início à missão, pouparam dinheiro por dois anos.
Entretanto, o controle financeiro continuou mesmo após o início da viagem. Por mês, o casal desembolsa entre R$ 2,5 mil a R$ 3 mil — a variação ocorre para cobrir passeios e despesas de manutenção da ‘Amazonas’, como é chamado o veículo do casal. Do total, gastam uma média de R$ 800 para combustível, R$ 200 para internet e entre R$ 800 a R$ 1 mil para alimentação.
Segundo Elka, morar sob quatro rodas acaba sendo mais barato do que em um imóvel fixo e o valor mensal chega a ser metade do que eles desembolsavam antes. “Quanto menos a gente gasta, mais longe vamos”, diz Elka.
Antes do sonho do road office se tornar real, o casal temia pegar a estrada com medo da insegurança. Mas se a vida na estrada mostrou o contrário e nunca foram assaltados. Para evitar perrengues, os publicitários têm o hábito de estacionar o ‘Amazonas’ em posto de combustível. “Quanto mais caminhoneiros, melhor”.
Escritório nunca mais…
O casal que atuava como freelancer, na capital amazonense, foi percebendo, que poderiam trabalhar de qualquer lugar, no escritório físico, num coworking, ou na estrada. A conversa com um amigo de Boa Vista (RR) foi o empurrão necessário para fazer do road office [escritório na estrada] o novo estilo de vida levando por muitos brasileiros e estrangeiros, na última década.
“Pensamos: os jobs estão acontecendo, os clientes estão confiando no serviço e a gente trabalha pela internet, qual a diferença de trabalhar aqui ou em qualquer parte do mundo? Foi quando passamos a planejar. Adaptamos a Dobló [primeiro carro da viagem] e saímos em novembro de 2016″, explica Elka.
Os primeiros cinco dias de viagem foram em cima de uma balsa de Manaus até Belém, no Pará. De lá partiram em direção ao Nordeste, com paradas em diferentes cidades. Após dois anos na estrada, chegaram ao Rio de Janeiro quando decidiram trocar de carro — agora uma van, mais espaçosa, confortável, onde adaptaram uma bancada atrás dos bancos do motorista e do passageiro para trabalhar.
Com o novo motorhome, foram até Ushuaia, no extremo Sul da Argentina. Em seguida iniciaram a viagem para o Norte do continente, quando conheceram cidades argentinas e chilenas.
Parados pela pandemia
Quando planejam desbravar o deserto do Atacama, foram paralisados pela pandemia que fechou a fronteira de vários países do mundo. Com isso, o casal decidiu voltar para o Brasil. Na época, em que a Organização Mundial de Saúde decretou pandemia mundial de Covid-19, o casal estava em Salta, na Argentina, e entraram no Brasil pelo Rio Grande do Sul.
“No caminho, fomos parados 16 vezes para inspeção sanitária”, conta Elka.
De São Borja (RS), foram até Cuiabá (MT), de onde planejavam seguir até Manaus. Contudo, descobriram que as balsas não estavam levando passageiro, apenas os veículos. Um amigo indicou um camping em Arraial d’Ajuda (BA), onde eles permaneceram quatro meses em isolamento.
No início de agosto, eles foram até São Paulo para fazer ajustes no ‘Amazonas’. Devido à pandemia, o casal deve chegar em Manaus em breve, onde devem aguardar até fevereiro de 2021 para decidir qual será o próximo destino.
Férias em diferentes datas
O casal amazonense trabalhava em uma agência de publicidade com horário certo para entrar, contudo, sem hora para sair. Eles exerciam a mesma função na agência e, por isso, não podiam marcar férias juntos. “Recebíamos salário, mas não curtíamos. E isso foi desgastando. Daí eu disse para o Luis: ‘ano que vem não quero mais isso’. E pedimos as contas juntos, em 2014”, relembra Elka.
A falta de tempo e o estresse diário foram o estopim para o casal tomar a decisão de largar o emprego. “A qualidade de vida era menor de zero. Eu era atleta e comecei a engordar muito, não estava fazendo bem para mim, não adiantava mais. Hoje, não me vejo de outra forma”, completou Luis.