*Da Redação do Dia a Dia Notícia
A pavimentação da BR-319, uma das obras de infraestrutura mais controversas e ambientalmente sensíveis do Brasil, está no centro de um acordo inédito entre os ministérios do Meio Ambiente e dos Transportes. Segundo reportagem de André Borges, da Folha de São Paulo, o pacto, selado por Marina Silva e Renan Filho, busca criar um plano socioambiental estruturado para finalmente viabilizar o licenciamento da rodovia e mitigar os severos impactos ambientais que marcaram sua história.
Batizado de “Plano BR-319”, o conjunto de medidas prevê um cronograma detalhado de ações voltadas à proteção ambiental e ao desenvolvimento social das comunidades localizadas ao longo da rodovia, que conecta Manaus (AM) a Porto Velho (RO). Entre as principais iniciativas, destaca-se a contratação de uma Avaliação Ambiental Estratégica (AAE). Essa consultoria especializada terá a tarefa de propor soluções inovadoras, para o desmatamento, a regularização fundiária e o fortalecimento das populações tradicionais e locais na região.
O plano também contempla a delimitação de uma faixa de proteção de 50 km de cada lado da estrada, considerada uma “zona crítica de impacto”. Dentro desse perímetro, serão implementadas ações permanentes de fiscalização, combate ao desmatamento ilegal e incentivo a atividades produtivas que sejam sustentáveis, como as cadeias agroflorestais.
Com 882 km de extensão, a BR-319 é a única ligação terrestre entre o Amazonas e o restante do país. No entanto, o chamado “trecho do meio”, com aproximadamente 400 km, permanece sem pavimentação devido a entraves persistentes no licenciamento ambiental. Tentativas anteriores de asfaltamento esbarraram em crescentes denúncias de desmatamento e na ausência de medidas eficazes de controle.
A reportagem ressalta que, em 2022, o trecho central da estrada foi alvo de ações de asfaltamento sem licenciamento definitivo, período que coincidiu com um pico alarmante de desmatamento de 2.240 km². Embora tenha havido uma leve queda em 2023, os dados ainda são considerados preocupantes.
O Ibama chegou a conceder uma licença prévia para a obra em 2022, mas as condicionantes ambientais impostas não foram integralmente cumpridas. Além disso, o processo é alvo de ações civis públicas, e sua licença foi suspensa novamente por decisão da Justiça Federal em julho de 2024, após recurso do Observatório do Clima que alegou “inconsistências legais, técnicas e ambientais”.
A BR-319 atravessa uma área de alta sensibilidade socioambiental, incluindo 19% de terras indígenas, 32,8% de unidades de conservação, assentamentos e áreas com regularização fundiária precária. Diante desse cenário complexo, o novo plano, formulado por um grupo de trabalho criado em 2023, visa estabelecer uma abordagem integrada que harmonize desenvolvimento e conservação.
Em resposta à Folha, o Ministério do Meio Ambiente afirmou que o plano, construído em conjunto com a Casa Civil, permitirá um debate aprofundado sobre a pavimentação e restauração da rodovia. O Ministério dos Transportes, por sua vez, declarou estar em diálogo permanente com outras pastas, buscando uma solução que uma “desenvolvimento econômico regional, garantia de direitos e sustentabilidade ambiental”.