*Da Redação do Dia a Dia Notícia
Barcos que transportam pirarucu e outros peixes amazônicos têm sido usados por facções criminosas como o Comando Vermelho (CV) e o Primeiro Comando da Capital (PCC), para traficar cocaína e skank, conhecida como “supermaconha”, pelos rios da Amazônia. As quadrilhas camuflam os entorpecentes em caixas de isopor com gelo e pescado, aproveitando o odor forte do peixe para despistar cães farejadores. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
A infiltração do crime organizado nessa cadeia produtiva levou o governo federal a recuar em projetos de incentivo ao manejo do pirarucu na região de Tabatinga (AM), na tríplice fronteira entre Brasil, Peru e Colômbia. Segundo Marta Machado, secretária nacional de Políticas sobre Drogas, o avanço das facções deixou comunidades locais temerosas de se envolver com a atividade. “Demos um passo atrás justamente pela vulnerabilidade das pessoas que estavam ali e o medo de se envolver com o crime organizado”, afirmou.
O Ministério da Justiça agora estuda investir em novas cadeias produtivas na região, próxima ao Vale do Javari, onde foram assassinados, em 2022, o indigenista Bruno Pereira e o jornalista Dom Phillips, em um contexto de conflitos ligados à pesca ilegal. O governo também busca fortalecer comunidades indígenas e ribeirinhas para reduzir o aliciamento de moradores por facções.
Nos últimos meses, uma série de operações policiais confirmou o uso da pesca como fachada para o tráfico. Em julho, a Polícia Militar do Amazonas apreendeu 23 quilos de cocaína e skank escondidos em uma caixa de isopor com peixes em uma embarcação abordada na Base Arpão, em Coari. Já em 2023, a Polícia Civil interceptou 1,5 tonelada de cocaína disfarçada em meio a 12 toneladas de pirarucu na região de Óbidos (PA).
Segundo relatórios de inteligência, os criminosos escondem drogas de várias formas — em vísceras de peixes, cilindros de oxigênio, paredes falsas e até porões adaptados dos barcos. O esquema é descrito por autoridades como uma “logística compartilhada”, onde o tráfico de drogas se mistura a outras atividades ilegais, como extração de madeira e caça de animais silvestres.
Atualmente, o Amazonas mantém quatro bases fluviais de fiscalização, conhecidas como Bases Arpão, e o Pará possui duas, com uma terceira em construção. Essas estruturas ajudam a monitorar o tráfego nos principais rios, mas o território extenso e de difícil acesso ainda favorece as rotas do narcotráfico.
Para Marta Machado, a resposta precisa ir além da repressão. “Precisamos proteger e fortalecer as comunidades locais para evitar o aliciamento e a colaboração com o crime”, afirmou. A secretária adiantou que o governo pretende lançar, ainda neste ano, um índice nacional para medir a presença de organizações criminosas em territórios indígenas, com apresentação prevista para a COP-30, em Belém (PA).
O avanço do tráfico pelos rios amazônicos, além de impulsionar a violência e a vulnerabilidade social, também agrava a degradação ambiental, com aumento do desmatamento e do garimpo ilegal em áreas protegidas — transformando a floresta em rota estratégica do crime e palco de uma disputa por sobrevivência e poder.
