Os Povos Indígenas aprenderam sobre os usos das plantas amazônicas ao longo de mais de 15 mil anos de vivência na região e, mais recentemente, as comunidades locais herdaram este conhecimento e adicionaram novos conhecimentos associados às novas demandas sociais e econômicas.
Na Amazônia, cerca de 2.200 espécies arbóreas possuem utilidade para as populações locais. Algumas dessas espécies são hiperdominantes, o que significa que ocorrem em abundância muito maior que a média. A maioria das 227 espécies hiperdominantes são úteis (93%) e a probabilidade de as espécies não-hiperdominantes terem utilidade varia 5% a mais de 81% para diversos fins, como a produção de alimentos, remédios, fibras, abrigo, lenha, construção, venenos, tinturas, roupas e outros. Estimativas da abundância dessas 2.200 espécies demonstram que representam 84% das plantas arbóreas (árvores e palmeiras) nas florestas amazônicas. As estimativas destacam também a relevância da sua abundância para o uso pelas culturas humanas na região.
O estudo foi realizado pela egressa de mestrado do Programa de Pós-graduação em Ecologia do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTI), Sara Coelho, junto com alguns coautores, que analisou 4.454 espécies arbóreas (árvores e palmeiras) encontradas em 1946 parcelas de inventários florestais da Rede de Diversidade de Árvores da Amazônia (Amazon Tree Diversity Network), e reuniu informações de uso de 29 livros (especialmente, compêndios) e artigos de etnobotânica amazônica publicados entre 1926 e 2013.
“Antes era comum a gente pensar no valor de uma dúzia de espécies que têm mercados regionais, nacionais e internacionais. Agora, Sara demonstrou que mais de 2.000 espécies têm uso. Cada uma dessas espécies representa uma oportunidade para algum empreendedor transformar este uso tradicional em potencial e este potencial em mercado”, diz o pesquisador do Inpa, Charles Clement.
Grande parte da abundância das plantas arbóreas presentes na região amazônica foi transformada pela população indígena e comunidades locais por meio de práticas culturais de manejo. Nas florestas amazônicas, várias espécies podem ter sido domesticadas em algum grau, como a castanha do Brasil (Bertholletia excelsa) ou a piquiá (Caryocar villosum). É comum que estas espécies domesticadas ocorrem em agregações, formando castanhais e piquiazais, que geralmente comprovam o manejo humano passado.
A domesticação de plantas trata da relação homem-planta que seleciona, acumula e cuida algumas dessas espécies, o que pode trazer mudanças nas características, tamanho, cor e doçura do fruto. Esse processo é a longo prazo, contínuo e aberto, e pode gerar populações semi-domesticadas ou totalmente domesticadas, de acordo com a prática de manejo, mudanças morfológicas e genéticas.
“Hoje a floresta está sendo derrubada num ritmo acelerado porque existe a impressão que não tem valor em pé. O que Sara demonstrou é que quase todas as árvores e palmeiras grandes (tamanho arbórea) tem usos. Se tem uso, tem valor”, ressalta Clement.
“O Inpa é a base que permitiu a Sara desenvolver suas ideias via discussões com a ampla gama de especialistas que temos aqui. Este ambiente intelectual serviu para apoiar Sara a desenvolver sua revisão da literatura e suas novas análises para transformar a informação ampla em novas percepções sobre a floresta”, continua o pesquisador.
O estudo destaca o valor socioecológico das plantas amazônicas e sua utilidade diária. Esta informação pode ajudar a planejar a conservação das florestas, porque mostra a importância da sociobiodiversidade e a relação entre o seu uso e sua abundância.
Saiba Mais
A publicação do artigo está disponível no Journals Plos One (clique aqui).