A vacinação contra a Covid-19 começou nesta semana em São Gabriel da Cachoeira (AM), no Alto Rio Negro, com imunização na sede do município e no interior da Terra Indígena Alto Rio Negro. A Secretaria Municipal de Saúde (Semsa) deu início à imunização na terça-feira (19/01) vacinando a técnica em enfermagem Juscelina Silveira da Silva, de 57 anos, indígena da etnia Tukano, que trabalha na Casa de Saúde Indígena (Casai) do município há cerca de 20 anos. Juscelina é a primeira moradora da cidade mais indígena do Brasil a receber a vacina contra a Covid-19.
Durante toda a pandemia a técnica em enfermagem atuou na linha de frente e chegou a contrair a Covid-19 no mês de abril. “Rezo para não adoecer e continuar trabalhando. Fico pensando em quem vai cuidar dos doentes”, disse ela, que ainda afirmou que em momento algum teve medo de receber a vacina e que os indígenas querem ser imunizados. “O que eu vejo é que eles querem a vacina e perguntam quando vai chegar na comunidade”.
Ainda na terça-feira foi vacinado o casal de idosos Mariquinha Navarro Campos, de 86 anos, da etnia Piratapuya, e Lauriano Freire Campos, de 88 anos, da etnia Tariano. Falando na língua Tukano, dona Mariquinha contou que vinha se tratando com os remédios tradicionais e benzimentos, mas que ficou muito feliz em ser imunizada. A prefeita em exercício Eliane Falcão estava presente e ajudou na tradução da língua indígena.
No território indígena, a imunização teve início no dia 20, sendo que o conhecedor tradicional e liderança do povo Baniwa, Luiz Laureano, de 80 anos, foi o primeiro a receber a dose do imunizante. Ele é morador da comunidade de Itacoatiara Mirim, às margens da BR-307, próximo à sede do município. Na quinta-feira, a vacinação teve continuidade no local. A indígena Luzia Inácio, de 80 anos, esposa de Luiz Laureano, recebeu a vacina.
Ela conta que durante todo esse período vem se cuidando com benzimentos e remédios caseiros. Além disso, evita ir à cidade. “Só vamos na cidade quando precisamos, para pegar comida. Temos medo da doença”, disse. Filho do casal, Moisés Baniwa chegou a lançar o filme “Wetapena nette ianhapakatti” (Nossos remédios e benzimentos) sobre as práticas indígenas que sua família utilizou para se proteger contra o novo coronavírus.
Outra moradora de Itacoatiara Mirim que recebeu a vacina foi a agricultora Janete Garrido, de 39 anos, também da etnia Baniwa. “Temos medo dessa doença que chamam Covid. Só vamos para a cidade de máscara e só para buscar o rancho. Fiz muito chá caseiro para combater a doença”, conta.
A imunização no território indígna é feita pelo Distrito Sanitário Especial Indígena Alto Rio Negro (ARN) e Dsei Yanomami. Conforme a logística do Dsei-ARN, as comunidades indígenas mais próximas ao núcleo urbano serão as primeiras a receberem as doses. Depois o imunizante será encaminhado às comunidades mais distantes. Algumas delas estão a até 800 km de distância da sede do município. O Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (Dsei Yanomami) prevê dar início à imunização em 28 de janeiro.
A vacina chega a São Gabriel da Cachoeira em meio a uma escalada da pandemia na região e durante a crise sanitária vivida em Manaus e outras cidades do Amazonas, com falta até mesmo de oxigênio. Órgãos de Saúde e parceiros trabalham para que o impacto da crise seja minimizado na cidade. Mas o colapso na capital do Amazonas afeta diretamente São Gabriel: o município não tem Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) e Manaus é referência para encaminhamento de pacientes graves.
Segundo boletim divulgado nesta quinta-feira pela Secretaria Municipal de Saúde (Semsa), a cidade registra 5.883 casos da Covid-19, com 67 óbitos. Em 1º de janeiro eram 5.029 casos e 59 óbitos, ou seja, somente neste mês foram confirmados 854 casos e sete novas mortes.
Nas comunidades indígenas também há alta de casos. O boletim indica 2.130 casos e 13 óbitos em comunidades atendidas pelo Distrito Sanitário Especial Indígena Alto Rio Negro (Dsei-ARN) nos municípios de São Gabriel, Santa Isabel do Rio Negro e Barcelos. Já o Dsei Yanomami registra 1.218 casos e 10 mortes.
As primeiras doses de vacina contra a Covid-19 chegaram no final da manhã do dia 19 no aeroporto Uaupés, em São Gabriel da Cachoeira. O secretário municipal de Saúde, Fábio Sampaio, e o presidente da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn), Marivelton Baré, estavam presentes para receber as caixas com o imunizante Coronavac. Nesta primeira fase, o município recebeu 13.984 doses. Desse total, 11.500 doses vão para o Dsei-ARN, 480 unidades vão para o Dsei Yanomami e 2.004 doses serão destinadas para a Secretaria Municipal de Saúde (Semsa). Os profissionais da saúde serão os primeiros a serem vacinados, conforme determinado pelo Ministério da Saúde. O município conta com cerca de 1 mil profissionais da saúde. Esse grupo já está sendo vacinado. Os idosos a partir de 60 anos começam a ser imunizados no dia 23.
Mesmo com a chegada das primeiras doses da vacina, o secretário de Saúde, Fábio Sampaio, reforça a importância das medidas de prevenção, sobretudo nesse momento de aumento dos casos. ”É muito importante que a população mantenha os cuidados de prevenção da Covid-19, use máscaras e faça o isolamento social até que a gente consiga imunizar todas as pessoas. A vacina é preventiva. É muito importante nesse momento manter as medidas de controle contra o novo coronavírus”.
*Notícia produzida a partir de Informes do Comitê de Enfrentamento e Combate à Covid-19 em São Gabriel da Cachoeira (AM).
Por: Ana Amélia Hamdan
Fonte: ISA