Em grande parte dos lares ribeirinhos da Amazônia, a energia usada para iluminar as casas, assistir televisão, ligar o ventilador e conservar os alimentos vem do gerador movido a combustível, uma fonte não renovável, poluente e cara. As dificuldades de acesso à energia também impactam diretamente a produtividade e geração de renda nas comunidades. Do manejo do pescado, passando pela produção de farinha, até a venda de artesanato, a tecnologia se tornou essencial para a manutenção de negócios sustentáveis e competitivos.
Diante deste cenário, a Fundação Amazonas Sustentável (FAS) realizou a instalação de painéis fotovoltaicos nos municípios de Maraã, Fonte Boa e Uarini, com objetivo de fortalecer o potencial socioeconômico de três empreendimentos localizados nas Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Mamirauá e Anamã, que são geridas pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Amazonas (Sema). Os recursos são oriundos do Fundo Amazônia/BNDES.
Ao todo, 128 famílias foram beneficiadas com a iniciativa que, além de energia limpa e acessível, garante também a tão “sonhada” e necessária conexão com a internet. “Na Amazônia, comunicação, logística e energia são pontos desafiadores, que dificultam qualquer empreendimento de funcionar. Nós temos uma logística muito onerosa na região, por conta das longas distâncias. Com a energia e a conectividade, conseguimos encurtar esse caminho, melhorar a comunicação e estreitar o canal de relacionamento com os potenciais compradores, colocando esses empreendimentos no século XXI”, destaca o coordenador do Programa de Empreendedorismo da FAS, Wildney Mourão.
Entre os empreendimentos contemplados pela iniciativa, está uma salgadeira para beneficiamento de pirarucu, localizada em Fonte Boa, distante 678 quilômetros de Manaus. O município amazonense merece destaque, pois é onde está situada parte da RDS Mamirauá, responsável por mais de 70% da produção de pirarucu no Estado. Cerca de 80 famílias de 12 comunidades terão acesso às tecnologias que agora fazem parte da estrutura da salgadeira, onde ocorrem os processos de salga, secagem, defumação e aproveitamento de subprodutos, como pele e carcaça.
Inaugurado em 2019, o empreendimento ajudou a alavancar a produção do peixe e gerar renda para as comunidades da região. “As comunidades pegam sua produção, trazem para a estrutura, aqui ele (o pescado) é processado, é produzido, é vendido, e o recurso volta todo para a comunidade”, conta um dos beneficiários, Edson Carlos.
Com a garantia de energia constante, os produtores terão mais segurança para trabalhar, além de facilidade na comunicação via internet, seja na hora de solicitar autorizações ou fechar contratos de venda, por exemplo. “A energia pode ir embora, mas a placa solar está aí. E dentro do escritório, vai ter uma pessoa que vai poder fazer esse pedido de guia sem nenhum problema”, afirma Madson Barroso, também beneficiário da ação.
O segundo espaço que recebeu a instalação do sistema de energia solar e internet foi uma empacotadora de farinha, sediada na comunidade de Campo Novo, no município de Uarini, a aproximadamente 550 km da capital, dentro da RDS Mamirauá. No local, é produzido o mais tradicional produto da agricultura familiar ribeirinha e “queridinha” no paladar dos amazonenses, a farinha de mandioca, vendida com o nome de “A Ribeirinha”, com apoio técnico da FAS. A iniciativa envolve a participação de 15 famílias e aproximadamente 30 produtores de quatro comunidades.
O grupo de artesanato Teçume D’Amazônia, da comunidade São João de Ipecaçu, na RDS Amanã, foi o último beneficiado pela ação. Localizado no município de Maraã, a 632 quilômetros de Manaus, o empreendimento é formado por mais de 30 mulheres de cinco comunidades, que produzem uma variedade de produtos a partir de sementes, fibras e madeiras da floresta, que carregam a memória das tradições locais.
Carteira de artesão
Em São João de Ipecaçu, além da instalação da infraestrutura, foi realizado serviço de cadastramento e renovação da Carteira Nacional do Artesão, em parceria com a Secretaria Executiva do Trabalho e Empreendedorismo (Setemp), órgão da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação (Sedecti). O documento garante uma série de benefícios para esses profissionais, como a emissão de nota fiscal (NF), que agora com a internet poderá ser feita na própria comunidade.
A ação também envolveu a realização de um treinamento para as artesãs e precificação dos produtos do Teçume D’Amazônia. “Padronizamos os tamanhos e gabarito de todos os produtos, realizamos um treinamento e também a precificação para que fique justo para quem produz, levando em consideração o tempo de trabalho dedicado, as matérias-primas usadas, os insumos. Ou seja, trabalhamos a base de gestão financeira com elas, para que possam ter um preço competitivo, dentro da lógica de comercialização”, explica o coordenador.
Conectividade
Nas regiões que enfrentam inúmeras barreiras logísticas, conectar-se à internet abre um leque de possibilidades nas áreas de saúde, educação, informação, entre outros serviços básicos para uma boa qualidade de vida. Segundo Mourão, esses benefícios também poderão ser aproveitados pelas comunidades ao entorno dos empreendimentos onde os sistemas de energia solar e internet foram instalados.
“Se a comunidade necessitar de teleatendimento, comunicação com a cidade ou algum parente, resolver questões de saúde, poderá fazer uso desse serviço. A internet tem múltiplas utilidades; serve tanto para ajudar com os arranjos produtivos sustentáveis, como também na comunicação para com a saúde e outros assuntos que as comunidades precisam”, afirma.
Com a pandemia do novo coronavírus, o acesso à rede representa ainda uma alternativa para a manutenção das atividades e projetos desenvolvidos pela Fundação nessas localidades. “As atividades presenciais não vão parar, mas elas agora se alinham à estratégia digital, através da produção de conteúdo, metodologias, cursos, consultorias e mentorias por meio da plataforma digital. Isso vai aproximar ainda mais a FAS dos empreendimentos, das comunidades, do seu público-alvo”, conclui.