*Alice Almeida – Dia a Dia On-line
A educação sexual, polêmica na época da candidatura de Jair Bolsonaro, voltou a ser debatida no Brasil e no mundo. Nas últimas semanas, o México propôs uma resolução na Organização das Nações Unidas (ONU) para tentar garantir o acesso a essa pedagogia e à saúde sexual da mulher. Mas afinal, qual é a importância da educação sexual?
Segundo a Unesco (Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura), estudos realizados em 2008 e 2016 mostraram que a educação sexual pode, ao contrário do que se pensa, fazer com que as atividades sexuais dos jovens se iniciem mais tarde e com menos frequência.
O estudo está disponível, em inglês, no link: https://www.unaids.org/sites/default/files/media_asset/ITGSE_en.pdf.
O ensino também contribui para o aumento da proteção no sexo, e maior conhecimento sobre gravidez e doenças sexualmente transmissíveis (DSTs). Além disso, as pessoas começam a utilizar os métodos de baixo custo para o HIV, disponíveis na rede de saúde pública, no Brasil.
A ONU considera que a educação sexual está relacionada à promoção de direitos humanos, especialmente para crianças e adolescentes. Por essa razão, a ONU é favorável a implementação de um currículo para educação sexual nas escolas:
“Educação sexual é um programa de ensino sobre os aspectos cognitivos, emocionais, físicos e sociais da sexualidade. Seu objetivo é equipar crianças e jovens com o conhecimento, habilidades, atitudes e valores que os empoderem para: vivenciar sua saúde, bem estar e dignidade; desenvolver relacionamentos sociais e sexuais respeitosos; considerar como suas escolhas afetam o bem estar próprio e dos outros; entender e garantir a proteção de seus direitos ao longo da vida.” (UNAIDS, Guia técnico para educação sexual).
O mais novo ministro da Educação, advogado e pastor Milton Ribeiro, é contra essa ideia, assim como Bolsonaro, que em 2019, chegou a dizer que as páginas sobre educação sexual da Caderneta de Saúde da Adolescente deveriam ser rasgadas.
Educação domiciliar
A educação sexual é um assunto que deve ser comentado não apenas nas escolas, como também dentro de casa. Durante a pandemia, Manaus registrou uma redução de 38% nos registros de crimes cometidos contra crianças e adolescentes no primeiro semestre de 2020. Os números, no entanto, podem não representar a situação real.
Segundo a delegada da Especializada em Proteção à Criança e ao Adolescente (Depca), Joyce Coelho, a redução de casos registrados no Sistema Integrado de Segurança Pública se deu em decorrência do isolamento social.
“Os crimes contra crianças e adolescentes são praticados, na sua maioria, por familiares. Então, quer dizer que elas ficaram em isolamento com seus agressores. A criança quando é abusada por familiares só fala sobre o crime em ambientes externos, como na escola, por exemplo”, disse a delegada.
Falar sobre questões sexuais com as crianças, mostrando, por exemplo, os sinais de um caso de abuso sexual, pode ajudar com que as próprias vítimas identifiquem as ocorrências e denunciem o seu agressor.
Em São Paulo, uma menina de 11 anos de idade escreveu um bilhete em que dizia que o seu próprio padrasto “mexia” com ela. Por conta disso, o homem, de 36 anos, foi preso em flagrante por suspeita de estupro de vulnerável, no último dia 15.
Bilhete ao qual o G1 teve acesso.
De acordo com o G1, a mãe da vítima resolveu se esconder dentro da própria casa, após receber o bilhete da filha, escrito “Mãe, o [nome do padrasto] meche comigo”. Ao ficar escondida, a mulher viu o homem colocando a criança dentro de um quarto, momento em que o flagrou de cueca ao lado da menina.
A menina passou pelo Instituto Médico Legal (IML), onde foi constatado que ela tem lesões de abusos que aconteceram anteriormente, segundo informações da Polícia Civil.
Casos como esse demonstram a importância de esclarecer o que são as partes íntimas e quais os limites do corpo da criança que devem ser respeitados sempre, assuntos que definem a educação sexual.
A isenção do Brasil
Em pauta no Conselho de Direitos Humanos da ONU, o Brasil se aproximou de países como Egito, Paquistão, Arábia Saudita e Rússia, onde as mulheres têm menos direitos que os homens, para ir contra uma resolução proposta pelo México, com o objetivo de eliminar o tabu sobre direitos e saúde sexual.
O Brasil, indo contra os países vizinhos da América Latina, apoiou os vetos dos países árabes, ao isentar-se da votação que ocorreu na última sexta-feira, dia 17, na Suíça, sede da ONU. As emendas dessas nações ultraconservadoras acabaram sendo rejeitadas.
Elma Okic/UN Photo
O texto principal da resolução fala da importância de acesso à educação sexual e direitos à saúde sexual, como uso de contraceptivos, medidas que diminuem a discriminação contra mulheres e meninas. A representação brasileira alega que tais ações podem promover o aborto, e por isso, preferiu se abster.
Organizações não governamentais e grupos ativistas posicionaram o seu descontentamento com a decisão adotada pelo Governo, criando o abaixo-assinado “Movimento civil a favor da segurança íntima”.