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Quinze histórias sobre o dia da semana mais controverso, misterioso e banal que nós temos

Livros pequenos de contos e crônicas me salvaram durante um puerpério tardio. Não tenho noção de quanto tempo durou depois do nascimento do Tomás, sei que nos primeiros seis meses eu não conseguia fazer muita coisa. É um grande borrão na memória desenhado pela exaustão – física e mental. Nos seis meses para fechar um ano, me lembro ativamente de tentar voltar a ler e ficar muito frustrada por não conseguir. Eu, que sempre engoli livros independentemente da quantidade de páginas ao mesmo tempo que fazia anotações e conexões juntando com lembranças e outras referências, me perdi completamente no personagem de mim mesma. Foram os livros pequenos, principalmente de contos e crônicas, que fizeram eu voltar a me encontrar.

 

Desenvolvi então uma valorização e um carinho imensos por livros e histórias curtas, na minha visão, muito mais difíceis de escrever, porque acho complexa a conexão com personagens e/ou situações em poucas páginas ou linhas. Também confesso que adoro a versatilidade de autores de que já li livros inteiros vestindo outras peles e outros personagens em histórias completamente diferentes que se diluem em 30, 20 ou 5 páginas. Isso sim é conhecer mais de quem escreve.

Em Dias de domingo, organizado por Eugênia Ribas-Vieira e que celebra os 90 anos da editora José Olympio, quinze autoras e autores brasileiros foram convidados e provocados a refletirem sobre o dia da semana mais controverso que temos: o tipo de sentimento que nos causa e a gama de sensações que variam na régua entre serenidade e euforia puras. Temos então extraordinários instantâneos dessas 24 horas do primeiro dia da semana (ou seria o último?) na visão de pessoas que se destacam no atual cenário literário brasileiro, e que acabam criando, então, uma antologia polifônica de ficção com dia da semana marcado.

Os contos foram escritos durante o segundo ano da pandemia de Covid e não há como não pensar o quanto a vida real interfere na produção artística. Sempre refleti sobre as safras culturais durante guerras, revoluções e momentos difíceis na história do mundo e também sobre o que aquilo significava naquele momento: tanto para o artista quanto para quem consome. Em Dias de domingo não há a pandemia propriamente dita em nenhum dos contos, mas é impressionante como ao mesmo tempo ela está presente, afinal, todos os quinze textos foram escritos direto de um país em plena crise sanitária, social e política que empilhou e empilha mortos diariamente. Os vestígios pandêmicos no texto aparecem em toques distópicos, algum realismo fantástico, no luto e na solidão.

Entre churrascos, idas ao salão, encontros familiares, desencontros amorosos, conflitos envolvendo a polícia e o asfalto e, principalmente, nossa domesticidade — seja representada pela rotina atual ou no resgate melancólico do passado — passeamos por textos precisos  e estilos distintos de Adriana Lisboa, Adriana Lunardi, Carlos Eduardo Pereira, Cintia Moscovich, Giovana Madalosso, Julia Wähmann, Juliana Leite, Marcelo Ferroni, Marcelo Maluf, Maria Ribeiro, Mauricio de Almeida, Noemi Jaffe, Sérgio Rodrigues, Tobias Carvalho e Veronica Stigger.

Fica ao fim da coletânea o gosto agridoce das páginas pensadas a partir do ócio, dos encontros e desencontros e da presença constante de objetos que nos remetem à casa: sofás, cadeiras, pratos, poltronas, camas, torneiras, telefones. Eles parecem tão neutros, confortáveis e iguais, mas, aos poucos, se diferenciam na singularidade de nossos usos cotidianos, moldando assim as rotinas únicas de cada um dos nossos Dias de domingo.

Heloiza Daou é movida à palavra e um pouco obsessiva. É diretora de marketing na Intrínseca e também mãe do Tomás, o job mais insano e amado da vida.

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